Monverde Wine Experience Hotel | O som do nevoeiro
"Hoje, no meu sexagésimo quarto aniversário, posso-vos dizer com sinceridade que, desde que cheguei à velhice, sempre bebi mais do que a maioria das pessoas diria que é bom para mim. Não me arrependi disso. O vinho, ao longo deste anos, foi para mim um amigo fiel e um sábio conselheiro. Muitas vezes ... o vinho mostrou-me a vida na sua verdadeira perspectiva e, como por toque de varinha mágica, reduziu grandes desastres a pequenos inconvenientes. O vinho iluminou-me páginas de livros e foi testemunha assíduo do romance que vivi. O vinho tornou-me ousado, mas não tolo; induziu-me a dizer coisas tolas, mas não a fazê-las." Duff Cooper
Na Quinta de Sanguinhedo, situada no norte de Portugal, entre as cidades de Felgueiras e Amarante, ergue-se o Monverde Wine Experience hotel, o primeiro hotel vínico da Rota dos Vinhos Verdes.
O Monverde é o rosto dos seus proprietários e um reflexo do que é hoje a Quinta da Lixa e da paixão pelo vinho e pelo que a natureza nos dá. Ali, estamos embebidos num nevoeiro de paixão pelo vinho e por tudo o que o rodeia, pelos seus mistérios, pelo que vamos sabendo sobre ele e pelo que faz com que cada golo seja diferente.
Todas as diferentes atmosferas do hotel conspiram para que a estadia seja verdadeiramente inesquecível, que envolva todos os nossos sentidos na vinha e no vinho, nas suas castas e nesta beleza tão natural.
Enrolado num ambiente de cores da terra onde as dimensões do vinho, território, clima e tradição pontuam em todos os detalhes, há por toda a parte objectos únicos dos trabalhos na vinha, surgindo como elementos esculturais que desenham o hotel, alguns deles perdidos no tempo.
O Monverde Wine Experience Hotel dispõe de 29 quartos e 1 apartamento, distribuídos pela propriedade em três distintas estruturas. Os quartos são confortáveis, funcionais, perfeitamente integrados na paisagem e estão vestidos com um casual chic que lhes assenta muito bem.
No edifício principal encontram-se os espaços sociais: SPA, piscina interior e exterior, restaurante, wine bar, ou uma zona leaving que apela à leitura ou a momentos em boa companhia, são apenas algumas das possibilidades.
O mote ‘Wine Experience’ é respirado em todos os cantos do hotel e no restaurante ganha novos aromas e intensidade. Em qualquer que seja a mesa escolhida, os visitantes são brindados com duas garrafeiras no horizonte – uma de parede, onde se podem observar vinhos provenientes das diferentes Regiões vitivinícolas do país; outra a céu aberto, a monumental vinha da Quinta da Lixa. Depois de já estarmos os três seduzidos por esta "elegância vínica", era chegada a hora do jantar.
Como cumprimentos do Chefe Carlos Silva tivemos crocante de alheira com redução de vinho doce acompanhado pelo O tal da Lixa - Sparkling. A redução de vinho doce funcionou muito bem com a ligeira voluptuosidade da alheira e com a acidez em forma de toranja e lima do espumante. O primeiro momento do menu vínico estava reservado para o escalope de Foie gras, com morangos salteados e molho de laranja harmonizado com um Sweet Creations 2015.
Sei que ainda vou no inicio da descrição do jantar, mas posso-vos já revelar que este foi o meu momento favorito. Muito por culpa de um Foie gras sedoso, quase com a textura de queijo derretido (ou de um ovo mal passado) e que se desfaz na boca onde encontra a acidez da laranja e aroma dos morangos.
O engraçado neste prato é que os morangos salteados fazem a ligação com o vinho de forma magistral, abrindo a porta para as lichias (muitas lichias), maracujá, damasco, ananás e flor de laranjeira do Sweet Creations 2015. Fez-me lembrar um bom Sweet Riesling e esse é um dos melhores elogios que lhe posso fazer, outro é o facto de ter comprado uma caixa para desfrutar com amigos e família :P
Seguiu-se o peixe predilecto dos grandes Chefes, pregado com puré trufado e bisque suave de mariscos, que entrou em cena de mãos (serão antes barbatanas? :P) dadas com o Pouco Comum Alvarinho 2016. Acompanhado com espargos cozinhados no ponto, o peixe bastante macio e com um sabor maravilhosamente suculento ganha excentricidade na presença de um vibrante puré de trufas. O aroma das trufas combinou muito bem com a brisa perfumada do vinho, que ainda acrescentou, maracujá, ameixa amarela, pêra, limão, giesta, frescura e alguma mineralidade. Um bom momento...
Esta ocasião marcou ainda a estreia da Bia a jantar fora de casa (nossa e dos avós), uma massinha esparguete. Entre o pedido e a chegada do prato passaram apenas 5 minutos. Quando questionamos a simpática chefe de sala Joana Monteiro acerca desta rapidez, esta informou-nos que na cozinha há sempre uma panela a ferver para estas eventualidades. Este é apenas um exemplo do cuidado, afinco e paixão com que ali se trabalha...
Já agora, a Bia adorou a massa :P
No prato de carne tivemos um riquíssimo naco de vitela sobre migas de grelos concertado com um Quinta da Lixa Reserva Alvarinho 2015. A vitela muito suculenta e carregada de sabor dançava muito bem com os pêssegos, maracujás e notas florais do Alvarinho. Notas florais essas que acentuavam o sabor dos grelos, o fumo do toucinho e a textura irrepreensível das migas.
O "exagero aromático" da casta está contido (não é um critica, gosto disso), a madeira não se sobrepõe à fruta e o vinho tem uma espécie de gordura que o faz ganhar estrutura. Longo, fresco e complexo, é um vinho surpreendente.
A competente e dedicada responsável pelos vinhos Daniela Ribeiro informou-nos que esses traços invulgares eram resultantes da singularidade e originalidade do terroir, com solos que misturam o granito muito próprio da Região dos vinhos Verdes com o xisto mais típico da Região do Douro.
Enquanto a Bia colocava a leitura em dia, surgiu na mesa o toucinho-do-céu com gelado de nougat de frutos secos casado inesperadamente com uma Aguardente Velha Morgado da Vila. Quando se provam em conjunto o gelado e o pó de bolacha, para mais tarde cheirar a aguardente, parece que estamos na presença de um Tawny antigo, envelhecido por muitos anos em casco.
O toucinho-do-céu é apurado, guloso, fresco e possuidor de um maravilhoso requinte conventual, onde os seus ingredientes exaltam aromas e sabores únicos e bem interligados dos ovos, das amêndoas e da chila. A amêndoa é o elo comum a este ultimo momento do jantar, está no toucinho-do-céu, está no gelado de nougat de frutos secos e está na Aguardente Velha Morgado da Vila. Para além de amêndoas exibe ainda tosta, caixa de tabaco e especiarias. Já provei muitas aguardentes vínicas antigas, esta é, sem margem para dúvidas, a minha favorita. Aveludada, graciosa, muito concentrada e com um final longuíssimo, complexo e muito equilibrado.
Um vinho, uma aguardente com mais de 50 anos, ao longo de tantos anos, é mais que uma bebida, é mais que uma harmonização para um determinado prato, tem obrigatoriamente de ser um amigo fiel e um sábio conselheiro. É com pedaços de história como este, em forma de liquido, que como por toque de varinha mágica, alguns grandes desastres se resumem apenas a pequenos inconvenientes :-P
O dia seguinte amanheceu com nevoeiro e muitas folhas, não o nevoeiro de Fernando Pessoa que envolve os portugueses, não os deixando ver a realidade de uma forma clara e racional, mas o de Ben Hecht, que realça a beleza das coisas e que nos dá a hipótese de as imaginar ainda mais agradáveis, sonhando acordados. Um nevoeiro de inverno, sereno, melancólico e até misterioso, espectador das folhas que caiem solenemente, para mais tarde morrerem sensacionalmente, deliberadamente e propositadamente, para nos deixarem com um som saudade.
Mostraram-nos no Monverde Wine Experience Hotel que o vinho traz na sua essência, o que o seu mentor carrega na alma. Acrescento que esse desígnio também se pode aplicar a este boutique hotel, pois como se costuma dizer quando alguém desperta para um grande sonho e sobre ele lança toda a força, todo o universo conspira a seu favor. Inicialmente era "apenas" para ser uma casa grande para os amigos do vinho, mas com o decorrer do tempo, pedra sob pedra, copo após copo, foi crescendo, ganhou raízes e tornou-se num dos mais belos hinos a esse amigo que nos vai acompanhando ao longo da vida, principalmente nos bons momentos, que é o vinho.
Obrigado Daniel Barreiro pela extrema amabilidade com que fomos tratados no Monverde. Também por isso, iremos com certeza voltar...