Wine Fest 2018 Porto | Os perigos de Chopin
"Esta música é muito perigosa. É como se contivesse canhões escondidos atrás de belas rosas." Czar Nicolau IPromessa feita ... promessa cumprida!!! A terceira edição do Enóphilo Wine Fest Porto realizou-se no passado dia 17 de Novembro e elevou os sentidos aos muitos enófilos que marcaram presença para provar e usufruir de bons vinhos. Em prova estiveram mais de 300 referências, entre novidades, vinhos premium e algumas raridades. Pela primeira vez o evento contou com iguarias gastronómicas que fizeram as delícias de todos. Tudo isto em plena fusão com o rio Douro, mesmo ali ao lado.
Cada vez mais ENÓPHILO é a marca associada ao encontro de apreciadores de vinho, que se juntam para provar referências diferenciadoras, apaixonantes e muitas vezes raras. Assim aconteceu no Porto, com esta terceira edição, a oitava a nível nacional (contando com Enóphilo Wine Fest Lisboa e Coimbra).Na Alfândega do Porto foi possível provar vinhos de quase todas as denominações de origem de Portugal Continental e ilhas. Tivemos ainda o prazer e privilégio de participar em duas provas Especiais com os espumantes Kompassus (Bairrada) e as colheitas do Czar, vinho licoroso (e não fortificado) da ilha do Pico.
Apesar dos frutos secos, mel e surpreendente frescura do Kompassus Blanc de Noirs 2009 destaco na prova dos espumantes a excelente exuberância aromática, o alperce, a avelã, o puré maçã, a acidez muito marcada e a tosta cativante do Kompassus Blanc de Noirs 2012.
Regressando à sala principal, foi um prazer voltar a conversar com o equilíbrio, madeira inebriante, cerejas, morangos, framboesas, mirtilos, amoras e ameixas bem maduras e sumarentas do Dona Graça Pai Horácio Grande Reserva Tinto 2013.
Mas, como já vos tinha dito, o Pai Horácio não se fica apenas pela fruta, tem também canela, noz-moscada, cravinho, resina, caixa de tabaco e sous-bois aliados à madeira deliciosa. É voluptuoso com taninos firmes mas redondos e equilibrados por uma acidez salivante. O final é intenso, equilibrado, complexo e misterioso.
Nos brancos escondia-se o vinho que mais me agradou na sala principal do evento, o Quinta das Bageiras Pai Abel Branco 2016. O nariz é bastante rico, complexo e exuberante, brindando-nos com melão, fisális, toranja, tisanas, violetas, pimenta branca, pedra molhada e um toque de pão. No palato é muito denso, preciso e intenso. A acidez é deliciosa e o final especiado, longo e harmonioso.
Nos licorosos fui surpreendido pela complexidade, elevada riqueza aromática, nozes, avelãs, damascos, toranja, caramelo e madeira exótica do Villa Oeiras Carcavelos 2005. Um vinho muito elegante, aveludado, com uma acidez bem vincada, equilibrado e com um toque salino que lhe acrescenta personalidade.
Na prova especial seguinte, as colheitas do Czar, descobri um Czar 2011 muito floral, com tabaco e mel. Muito delicado, fresco e bem estruturado, ganhando largura com uma salinidade bastante contundente e uma deliciosa secura. Neste, tal como nos outros, o nariz e cor fariam adivinhar algo mais doce, algo mais fácil, algo mais consensual, algo mais "Porto", só que não.
2011 "só" foi suplantado pelo Czar 2009. Seco e equilibrado exibe orgulhosamente notas de avelãs torradas, pinhões, nozes, chocolate branco, caixa de tabaco e sal marinho. Esta maior percepção de sal conjugada com uma excelente acidez e um toque muito ligeiro de açúcar residual, fez com que, no meu palato, ganhasse mais profundidade.
Uma palavra ainda para o elegante Czar 2008. Provavelmente aquele com o melhor nariz (caramelo, iodo e frutos secos) e que exibe o melhor (será perfeito?!?) equilíbrio entre acidez, doçura, álcool e estrutura. As vinhas onde estes vinhos são produzidos, são centenárias e localizam-se na zona dos lajidos da Criação Velha, da ilha do Pico, zona classificada pela UNESCO como património mundial .
Por se tratar de um vinho totalmente natural (sem adição de álcool, açúcar ou leveduras), a sua composição varia segundo o grau de maturação e as condições climatéricas registadas em cada ano, podendo-se apresentar como seco, meio seco, meio doce ou doce.
Após a revolução Russa em 1917, foi encontrado vinho licoroso da ilha do Pico nas caves históricas do palácio do último Czar, Nicolau II. Vinho esse que havia sido embarcado em barricas nos Açores e enviado propositadamente os banquetes reais dos czares, daí se ter tido a feliz ideia de se baptizar este vinho como: “Czar”.
O que é comum a todos estes vinhos Czar que provei? A diferença abismal entre aquilo que se cheira (frutos secos, salinidade e maturação) e aquilo que sentimos (secura, acidez e austeridade) no palato. E por isso, é um vinho perigoso, quase como a dança polonaise de Chopin, que parece esconder timidamente venturosos canhões atrás de belas rosas.
Parabéns Luís pela organização impecável, pela inclusão de momentos gastronómicos e por teres proporcionado um espaço maior ao evento, com o ambiente ENÓPHILO de sempre.
Até para o ano, no sítio do costume ;)