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No meu Palato

No meu Palato

Quinta do Convento Reserva Branco 2018 | A batalha pelo amor e pelo vinho

"A manhã, meio fria, meio morna, alava-se pelas casas raras das encostas no extremo da cidade. Uma névoa ligeira, cheia de despertar, esfarrapava-se, sem contornos, no adormecimento das encostas... E tudo aquilo — toda esta frescura lenta da manhã leve, era análogo a uma alegria que ele nunca pudera ter." Fernando Pessoa

Quinta do ConventoNum sector onde, aparentemente, existem apenas duas opiniões que realmente contam (sobretudo no sector internacional), as da Wine Spectator e as de Robert Parker (que frequentemente, demasiadas vezes, estão de acordo),  é um verdadeiro prazer descobrir alguém com uma visão diferente deste mundo que nos apaixona. É por isso que sigo regularmente as opiniões de outros monstros vínicos como Jancis Robinson e Sarah Ahmed, e de outras personalidades menos conhecidas do grande público, como  Madeline Puckette, Jean Lenoire e Alice Feiring.

Quinta do ConventoDiverti-me imenso enquanto li o último livro de Alice Feiring: "A batalha pelo amor e pelo vinho, ou como eu salvei o mundo da Parkerização". O mundialmente influente crítico americano Robert Parker preferia vinhos (sobretudo tintos) altamente extraídos que passassem por longos períodos de maturação em barris de carvalho e com elevado teor alcoólico. Por causa dessas preferências (que levavam consequentemente a melhores pontuações), muitos produtores começaram a criar vinhos Parkerizados,  densos, compotados, muito alcoólicos e não olharam a despesas quando necessitaram de comprar novas barricas de carvalho francês e americano, elevando consideravelmente o preço dos vinhos. 

Quinta do ConventoEste método de mudar um estilo de vinho para atender às preferências de Robert Parker, na esperança de obter uma pontuação mais alta é vulgarmente conhecida como Parkerização. Apesar, de também eu, por vezes, gostar de um tinto extraído e encorpado, esta não pode ser a bitola usada para medir a excelência de um vinho.  Foi por isso, que por diversas vezes, dei comigo a  aplaudir mentalmente os comentários/críticas de Feiring sobre o que ela chama de vinhos "falsificados": "fruta exagerada", "frutas chatas", "mais frutas", "fruta despropositada e sem sentido", "carvalho que enjoa", "carvalho opressor"  e "carvalho, carvalho, e mais carvalho!!!". A certa altura, ela cita uma nota de Parker de um Napa Cabernet de 95 pontos:

Quinta do Convento«Uma besta taninica primordial com uma concentração semelhante a sangue bovino, uma enorme cor púrpura opaca e notas de terra queimada, amoras, chocolate, cera, carne fumada e cassis. É como se eu pegasse num bife de Porterhouse, um famoso restaurante de Peter Lugar, o cozinhasse e envelhecesse em carvalho novo." A resposta de Feiring é tão corrosiva quanto fulminante: "Essa é uma óptima descrição de um vinho que eu rapidamente despejaria no ralo".

Quinta do ConventoFeiring é uma adepta confessa de vinhos puros, com arestas, com evidências genuínas de terroir e elegantes, desprezando muitas facetas do mundo moderno do vinho: leveduras cultivadas, barricas novas com muita tosta, fertilizantes químicos, viticultores não produtores, osmose inversa e o que ela vê como um excesso de confiança na ciência ao invés de uma abordagem mais empírica. Tudo isto, a propósito de um vinho que teria boa nota com Alice Feiring e que enervaria Robert Parker, o Quinta do Convento Reserva Branco 2018 (18€, 91 pts.).

Quinta do ConventoA vindima ocorreu a 23 de Setembro de 2018. Aquele dia impunha-se como o tempo certo para colheita uma vez que as uvas estavam num ponto de maturação ideal, o objectivo passava por salvaguardar a acidez, diferenciadora, verdadeira “espinha dorsal” de um vinho branco, traço de identidade, de origem, ou do que é o terroir de altitude da Quinta do Convento de São Pedro das Águias. Depois, a evolução na adega e nos dez meses de barrica de carvalho francês viriam a confirmar o seu enorme potencial. Este é o primeiro Reserva Branco com assinatura Kranemann Wine Estates, propondo a máxima expressão de elegância e frescura desse Douro tão especial que é o Vale do Távora.

Quinta do ConventoExibe uma sedutora cor amarelo-cítrica, clara e cristalina e aromas muito puros a limonete, flor de laranjeira, cardamomo e tília. A fruta quase que é preciso procurar em segundo plano, surgindo o limão e o damasco. No palato está cheio de elegância, de frescura lenta e alegre e de uma mineralidade (xisto molhado) bem vincada.

Quinta do ConventoQuer a sua acidez, quer as notas subtis da barrica dão-lhe uma aptidão gastronómica invejável, sobretudo em pratos mais untuosos como o "Risoto" de bulgur, pimentos, cogumelos Shimeji e ervilhas com 3 texturas.  Este é um excelente exemplo do que um vinho branco do Douro deve ter: elegância, mineralidade, frescura, e identidade. Toda essa frescura, lenta da manhã leve, era análoga a uma alegria que Parker nunca pudera ter. ;)

 

"Risoto" de bulgur, pimentos, cogumelos Shimeji e ervilhas com 3 texturas:

-Num tacho levem a ferver um grande volume de água com sal. Juntem a Quinoa e Bulgur (usei a mistura da Tipiak) e deixem cozer, fervendo durante 12 minutos. Decantem de modo a ficarem com a quinoa e bulgur sem água;

-Noutro tacho façam um refogado com alho, cebola, pimentos, ervilhas e cogumelos Shimeji;

-Façam um puré de ervilhas e guardem parte dele para fazerem umas "pequenas moedas" de ervilha que vão levar ao forno para desidratar e fazer umas chips de ervilha;

-Voltem a introduzir no tacho o bulgur, acrescentem manteiga, queijo parmesão, pimenta preta, um pouco de noz-moscada e brandy. Cozinhem 5 minutos;

-Ao empratar coloquem na camada de inferior o puré de ervilha, depois o risoto de bulgur e no top as chips de ervilha.