Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

No meu Palato

No meu Palato

Herdade da Lisboa | Do Alentejo, com espendor

"O erro vulgar consiste em confundir o desejar com o querer. O desejo mede obstáculos, a vontade vence-os. Querer é quase sempre poder: o que é excessivamente raro é o querer." Alexandre Herculano

Herdade da LisboaTodos nós, aqueles que são pais ou então aqueles que contactam regularmente com crianças, já fizemos aquela brincadeira de dar a provar limão aos pequenotes, para nos deliciarmos com a sua expressão de espanto, no preciso momento em que o azedo é apresentado ao seu palato. Essa percepção é uma das mais vincadas que podemos ter ao provarmos algo. Aliás, para alguns de vós, só o simples facto de estarem a ler estas palavras, deve de ter provocado uma pequena salivação extra. É essa mesma sensação que nos pode ajudar a inferir o nível de acidez de um vinho.

Herdade da LisboaEssa acidez vínica é bem mais importante do que aquilo que possamos inicialmente pensar. Ela faz com que (tal e qual como acontece quando colocamos sumo de limão no gin, num pudim ou num peixe grelhado) os outros sabores sejam realçados, criando uma sensação de maior harmonia. Sem essa acidez, o vinho podia tornar-se demasiado pesado, plano, sem vida, desequilibrado e chato. 

Herdade da LisboaMas uma maior acidez detectada no nosso palato não significa obrigatoriamente um menor pH. (Caso não tenham estado atentos nas vossas aulas de Física e Química, relembro que o pH é uma escala numérica utilizada para especificar a acidez ou basicidade de uma solução aquosa. Entre 0 e 7 a solução é ácida, 7 é neutra, e entre 7 e 14 a solução é básica. Quanto menor este valor mais ácida é a solução). 

Herdade da LisboaSem entrar em muitos detalhes podemos resumir que a acidez total indica a concentração total de ácidos presentes no vinho, enquanto o nível de pH indica a intensidade desses mesmos ácidos. Por exemplo, se na ficha técnica de um vinho lermos que ele tem 6 g/l de acidez total e um pH de 3.2, ele levará a uma percepção de acidez mais vincada do que um vinho com 4 g/l de acidez total com o mesmo nível de pH.

Herdade da LisboaDo mesmo modo, a acidez percebida no palato pode não estar relacionada com a acidez real (medida na concentração de ácidos ou através do pH). Se não vejamos. Entre o sumo de limão e a Coca-Cola qual vos parece ser o mais ácido? O limão? Errado!!! Tecnicamente, estas "soluções" têm o mesmo pH (cerca de 2,5) e uma concentração total de ácidos bastante próxima, mas como a Coca-Cola é muito mais doce, não sentimos tanto essa acidez. 

Herdade da LisboaÉ por isso que no mundo (fascinante ;)) dos vinhos usamos frequentemente a expressão "fresco" para caracterizar essa percepção de acidez no palato e que não advém apenas das características "cientificas e mesuráveis" como a acidez total e o pH. Nas regiões mais quentes as uvas amadurecem com mais facilidade, resultando numa menor acidez, maiores teores de açúcar e cores mais carregadas. 

Herdade da LisboaPelo contrário é mais provável encontrarmos vinhos mais encorpados e frutados numa região quente do que numa região mais fria, na qual as uvas têm mais dificuldade em amadurecer. Nestes climas mais frios são induzidos níveis mais elevados de acidez, níveis mais baixos de açúcar e um corpo mais leve, resultando em vinhos mais secos, finos e refrescantes.

Herdade da LisboaVirando esta discussão para o nosso Alentejo, diríamos que os vinhos lá produzidos se enquadrariam mais no grupo dos "mais encorpados e menos frescos". Se isso é verdade para a maioria dos casos, também existem felizes excepções, sendo uma delas o singular terroir da Vidigueira. Graças à sua barreira natural provocada a Norte pela Serra do Mendro, o clima mediterrânico local distingue-se pelas amplitudes térmicas elevadas, com noites consideravelmente frias para o padrão alentejano e que emprestam aos vinhos uma inusitada acidez, elegância e em alguns casos uma certa finesse aristocrata. 

Herdade da LisboaOs novos vinhos da Herdade da Lisboa exibem todos estes predicados, conjugando-os com um novo paradigma para os vinhos varietais alentejanos. Esta nova gama de topo da Herdade da Lisboa, na Vidigueira, assume-se como uma colecção premium de vinhos varietais, edições limitadas (não chegam a 1% do total da produção) e exclusivas do melhor de cada casta, em cada ano.  Para esta estreia, a Herdade da Lisboa apresentou na semana passada o branco Viognier 2019 e o tinto Trincadeira 2019.

Herdade da LisboaIntegrando a marca que notabilizou a Herdade da Lisboa nos anos 80, o Paço dos Infantes Chardonnay 2020 (13.50 €, 88 pts.) foi também incluído nas novidades desta primavera. De cor amarela cítrica cristalina exibe notas muito puras a limão, maçã verde, sílex e baunilha.  O estágio de 6 meses em barrica carvalho francês de 500 litros deu-lhe mais comprimento, cremosidade e complexidade. Tudo isto conjugado com uma bela acidez faz com que este vinho seja muito prazeroso na prova. 

Herdade da LisboaPor sua vez o Herdade da Lisboa Viognier 2019 (56,00€ a caixa com uma garrafa de Herdade da Lisboa Trincadeira 2019 + uma garrafa de Herdade da Lisboa Viognier 2019, 90 pts.) foi fermentado em barricas de carvalho francês de 500 litros durante 20 dias, sendo depois submetido a um estágio de 6 meses sobre borra fina com batônnages periódicas. O resultado foi um vinho amarelo palha límpido, com notas complexas a acácia-lima, uvas frescas, damasco, noz-moscada, alguma pedrogosidade (xisto molhado) e ligeiros apontamentos arbustivos.  No palato é cheio, untuoso e muito fresco, prolongando-se de modo muito elegante.

Herdade da LisboaCombinou na perfeição com um Arroz de favas e enchidos com veja dos Açores grelhada.  Nesta prova, o meu preferido foi, contudo, o Herdade da Lisboa Trincadeira 2019 (56,00€ a caixa com uma garrafa de Herdade da Lisboa Trincadeira 2019 + uma garrafa Herdade da Lisboa Viognier 2019, 92 pts.), que estagiou 12 meses em barrica de carvalho francês de 500 litros. Com uma "enganadora" rubi-clara cristalina, carrega aromas frescos, complexos e sedutores a mirtilos, ameixa vermelha, pimenta preta, canela, arruda e uns ligeiros fumados. Na boca exibe uns taninos polidos e é crocante, fresco e muito complexo. É o melhor Trincadeira que provei até hoje.

Herdade da LisboaEste vinho também combinou bem com o Arroz de favas e enchidos com veja dos Açores grelhada mas portou-se ainda melhor com uma Bolacha de foie gras, tempura de legumes e gelado de beterraba. Todos estes vinhos têm a particularidade de terem sido desenhados de modo a que a madeira contribuísse o máximo possível para a complexidade e textura dos vinhos, sem que isso manchasse minimamente a qualidade/beleza da fruta, a particularidade da mineralidade e a elegância da sua prova, deixando, desta forma, que o terroir da Vidigueira se expressasse todo o seu esplendor.  

Herdade da LisboaO que vem mostrar que nisto dos vinhos, o que existe "à nascença" não condiciona, de modo irreparável, aquilo que queremos fazer. Querer é quase sempre poder: o que é excessivamente raro é o querer. Ainda bem que na Herdade da Lisboa querem ... fazer bem, fazer diferente e fazer com sentido. ;) Parabéns!!!

 

Arroz de favas e enchidos com veja dos Açores grelhada: 

-Partam em cubos pequenos uma linguiça, um pouco de toucinho fumado e uma chouriça, acrescentando-os a um refogado de cebola;

-Acrescentem as favas (sem peles), deixem dourar um pouco e acrescentem o quadruplo do volume do arroz que vão cozinhar, temperando com sal, pimenta, noz-moscada e um pouco de tabasco;

-Depois das favas terem cozinhado em lume brando por 10 minutos acrescentem o arroz carolino, retificando os temperos.

-Grelhem os lobos de veja (5 minutos de cada lado, começando com o lado onde estavam as escamas para baixo)  em azeite e alho, temperando com sal e pimenta preta.

 

Bolacha de foie gras, tempura de legumes e gelado de beterraba:

-Partam uma batata doce (de preferência de polpa laranja) em rodelas grossas e levem ao forno a 210ºC, apenas com sal, pimenta e oregãos, até as rodelas estarem alouradas. Esta vai ser a base da bolacha;

-Partam o foie gras com a mesma espessura (e diâmetro) da rodela de batata doce;

-Façam uma tempura com alho francês, cebola, pimento, cenoura e beringela;

-Para o gelado cozam as beterrabas já descascadas em água e sal (reservem uma para levarem ao forno). Triturem-nas e juntem um pouco de ginja, açúcar mascavado, natas magras, sal e sumo de um limão e cozinhem por 2 minutos. Levem ao congelador para usarem mais tarde (necessita de pelo menos 4 horas antes de ser servido);

-Montem a bolacha (base de batata doce, depois foie gras, depois a tempura e por último umas batatas fritas finíssimas).

Fundação ADFP | O sussurro de Galileu

"Não é tanto o que fazemos, mas o motivo pelo qual fazemos que determina a bondade ou a malícia." Santo Agostinho

Fundação ADFPUma das mais famosas estórias da história da ciência é aquela relacionada com o julgamento de Galileu Galilei. Galileu acreditava que a Terra se movia em torno do Sol, mas essa teoria chocava de frente com a posição teológica da Igreja Católica, que sustentava que a Terra estava fixa no centro do universo. 

Fundação ADFPEste conflito chegou ao auge quando Galileu foi levado a julgamento, sendo aí forçado a desmentir, condenar e repudiar publicamente a sua teoria: a do movimento da Terra em torno do Sol. Segundo a estória e já depois de fazer sua renúncia pública e respectiva abjuração, Galileu terá murmurado "Eppur si muove!" que em italiano significa "ainda assim,  ela move-se!!!" O que muitos não sabem, é que esse movimento não se referia apenas ao planeta.

Fundação ADFPApesar de ainda não existirem evidências contemporâneas de que Galileu realmente tenha proferido essas palavras, esta não deixa de ser uma boa estória, uma vez que metaforiza a frustração que Galileu sentiu em relação aos elementos do clero, pois o astrónomo tinha boas razões para acreditar que a Terra se movia realmente em torno do Sol. 

Fundação ADFPEle tinha conseguido observar as diferentes fases de Vénus, o que provava que esse planeta se tinha de mover em torno do Sol, descobrindo também quatro luas em torno de Júpiter. Ambas as observações demonstravam, na prática, o modelo heliocêntrico de Copérnico, que defendia que o Sol era o centro do universo.

Fundação ADFPEstas primeiras evidências heliocentristas começavam a tornar-se num grande problema teológico para a Igreja, pois parecia impensável que a criação divina de Deus, a humanidade, fosse remetida para segundo plano, para um planeta menor, em vez de ocupar o centro do universo.

Fundação ADFPPara além de tudo isto, havia ainda o pequeno "detalhe" da Bíblia afirmar claramente que a Terra não se move. A grande batalha judicial entre Galileu e a Igreja católica prendia-se com o facto desta "teoria" de Galileu se poder assumir como um facto cientifico ou apenas como uma hipótese. 

Fundação ADFPAlguns elementos da Igreja chegaram mesmo a admitir em tribunal que as observações de Galileu poderiam transmitir a falsa sensação da Terra se mover em torno do Sol, acrescentando que essa aparente realidade podia enganar.  Por um lado a Igreja argumentava que Galileu não havia provado completamente a sua hipótese, e por outro, Galileu (tal como eu) achava ridícula a necessidade de interpretar literalmente as passagens metafóricas da Bíblia. 

Fundação ADFPO certo é que, e como não poderia deixar de ser naquela época, a Igreja levou a melhor, fazendo com Galileu fosse preso em 1633. Em 1642 Galileu morre com 77 anos.  Desde então, a Igreja, foi revertendo paulatinamente a sua posição relativamente às conclusões de Galileu. 

Fundação ADFPEm 1757, o trabalho "Diálogo sobre os Dois Principais Sistemas do Mundo" de Galileu foi removido do Índice, uma lista bastante antiga de publicações proibidas pela Igreja. Quando uma investigação "independente" levada a cabo nos anos 80 do século passado por um painel de cientistas, teólogos e historiadores, elaborou um relatório preliminar defendendo que Galileu havia sido condenado injustamente, escancarou as portas para o "pedido de desculpas" por parte da Igreja.  

Fundação ADFPQuase a fechar o milénio passado, em 1992, João Paulo II consuma esse pedido de desculpas póstumo a Galileu. Em 2001, o mesmo papa volta a pedir "cem vezes perdão" não só a Galileu, mas também por outros erros cometidos pela Igreja.

Fundação ADFPSão disso exemplo as cruzadas, o apoio a ditaduras, as iniquidades cometidas contra as mulheres, a marginalizarão dos judeus, a conivência com guerras, a excomunhão de religiosos reformadores como Lutero, João Calvino, Ulrich Zwingli e Jan Hus, o tratamento de segunda dado aos negros e a violência cometida sob o chapéu da evangelização dos índios da América.

Fundação ADFPO "processo Galileu" é ainda uma verdadeira tragédia de valores, não só pelo papel determinante da Igreja Católica mas também pelo envolvimento de políticos e de outros cientistas mais conservadores, que em conjunto tentaram salvar as aparências do sistema Aristotélico-Ptolomaico, que colocava a Terra imóvel no centro do universo. Este episódio inicia também uma guerra de vaidades entre ciência e religião, amplificada 2 séculos depois com a Teoria da Evolução de Charles Darwin, completamente desnecessária e sem substância.  

Fundação ADFPComo cristão e também cientista, acho que esse "medir de forças" é inútil, uma vez que estes dois mundo são claramente compatíveis. A ciência concentra-se na mecânica, na explicação de como as coisas funcionam, enquanto a religião faz perguntas sobre o propósito, sobre a moral, sobre a integridade. A ciência foca-se no "como" enquanto a religião se devia centrar no "porquê".  

Fundação ADFPPara que esta relação entre estes dois pesos pesados da nossa civilização seja proveitosa  e pacifica, e tal como acontece/devia acontecer noutras esferas da vida, são necessários abertura, compreensão e bondade. E disso, Galileu também é um bom exemplo, enquanto era acusado injustamente pela Igreja procurou sempre criar pontes, chamando diversas vezes a atenção para o problema de se interpretar, à letra, o que está escrito na Bíblia. Para percebermos isso é necessário que outra coisa para além do planeta Terra se mova: a bondade.

Fundação ADFPReflectir sobre este momento da vida de Galileu Galilei ajuda-nos não só a entender a dialéctica da evolução mas também a necessidade de conservar essa mesma evolução no âmbito do humanismo. E é aqui que faço a ponte com a Fundação Assistência, Desenvolvimento e Formação Profissional (ADFP).  

Fundação ADFPEsta fundação possui o Hotel Parque Serra da Lousã, o Parque Biológico da Serra da Lousã, o restaurante Museu Da Chanfana, o Templo Ecuménico Universalista e o Conimbriga Hotel do Paço. Tivemos a oportunidade/privilégio de conhecer todos eles aquando da nossa viagem na EN2.

Fundação ADFPA ADFP  é uma Instituição sem fins lucrativos que apoia mulheres/mães em situação de pobreza, crianças “sem família“, jovens e adultos com deficiência ou doença mental, idosos doentes em fim de vida, refugiados e pessoas “sem abrigo”, fomentando um conceito de turismo com propósito onde todo o saldo positivo gerado é reinvestido na acção social da instituição. Haverá no sector do turismo bondade maior que esta? 

Fundação ADFPO Hotel Parque Serra da Lousã foi pensado para que os hóspedes possam desfrutar da natureza que o rodeia com paixão e conforto.  Lá é possível respirar o ar puro no meio das maravilhosas aldeias e paisagens da região, mergulhar numa reconfortante piscina, percorrer os trilhos pedestres, andar de bicicleta BTT,  passear no parque biológico ou desfrutar de um magnífico passeio a cavalo. 

Fundação ADFPNo restaurante Museu Da Chanfana provei a melhor chanfana de sempre e um doce surpreendente: a nabada, uma espécie de chila feita com nabos, mais vegetal, adstringente, intensa, e claro, com um  insólito travo a nabo. A 15 minutos do hotel/museu encontra-se Gondramaz, uma graciosa, inusitada e misteriosa aldeia de xisto. Este é um retrato vivo do Portugal de há meio século. Precisam de 3 horas para se perderem no tempo e visitar a Cascata da Ribeira e o Penedo dos Corvos. 

Fundação ADFPNo Parque Biológico da Serra da Lousã, com mais de 400 animais (águias, corujas, ursos-pardos, linces, lobos, raposas, javalis, mas também vários herbívoros como gamos, veados, corços e cabras) foi-nos permitido conhecer, detalhadamente, a vida selvagem do nosso país. Há ainda um museu, uma quinta pedagógica, visitas guiadas, um centro hípico e ao longo do percurso é possível descansar à sombra de castanheiros, carvalhos, medronheiros, entre outras espécies de flora existentes nas matas e florestas circundantes. 

Fundação ADFPA 10 minutos de carro, encontramos o Templo Ecuménico Universalista (sim, há uma pirâmide em Portugal ;)), onde se imortalizada a bondade de Galileu. Este é um sitio destinado à reflexão espiritual de pessoas de diferentes religiões, aberto a não crentes, promovendo valores fundamentais da humanidade e das religiões, como a verdade, a bondade e a moral. 

Fundação ADFPO Templo salienta ainda a tolerância e o respeito pelos que nos são diferentes, representando a criação da humanidade pelo Homo Sapiens, inventor da espiritualidade, da fraternidade e da busca da verdade. Um sitio, para conversarmos, em silencio, com o nosso interior sobre a relação que temos com os outros e com as diferentes interpretações religiosas que existem do mundo. Para quem gosta de ciência, também há umas coisas engraçadas a descobrir. ;) 

Fundação ADFPDepois de bebermos todo este património natural (e também de valores) a paragem seguinte foi o Conimbriga Hotel do Paço. Situada a poucos minutos das históricas ruínas de Conimbriga, do centro da histórica cidade universitária de Coimbra e das Aldeias de Xisto esta unidade é local único para desenvolver turismo histórico, de natureza e gastronómico. 

Fundação ADFPUm hotel nobre, desde a romântica e singela escadaria em madeira, às salas com tectos altos, passando pelas peças de arte (quadros, tapeçarias e esculturas) e pelas grandes portadas com vista para o parque e para as árvores centenárias do jardim. Nesse jardim há ainda uma piscina reconfortante rodeada por natureza e aristocracia. 

Fundação ADFPNo restaurante do hotel, o Gavius são servidos os mais deliciosos pratos da gastronomia regional, acompanhados por bons vinhos locais e um serviço acolhedor e qualificado (um obrigado especial ao Chefe de sala Carlos pelo carinho com que nos tratou).  

Fundação ADFPO seu universo mágico aliado ao secular património arquitectónico transformaram este hotel numa lenda viva que completa uma oferta de excelência, assumindo-se, indelevelmente, como uma referência hoteleira incontornável na região. A apenas 10 minutos de carro podem encontrar as Buracas do Casmilo, ainda longe dos principais roteiros do país, este vale encantado permanece rodeado de natureza pura, onde a harmonia e a paz criam uma atmosfera única.  

Fundação ADFPAs "buracas" situam-se a norte da Serra do Rabaçal, a poucos quilómetros de Condeixa-a-Nova, na aldeia de Casmilo. Chegados à aldeia, existem várias placas a indicar o caminho para esse excesso pavoneante da natureza. Este recanto serrano exibe orgulhosamente vertentes abruptas e nuas, onde existem vários abrigos rochosos, as tais “buracas”.  

Fundação ADFPNa verdade, estas inusitadas formações geológicas resultam de um abatimento da parte central de uma conduta que deixou a descoberto as suas partes laterais extremas de uma antiga gruta existente no interior do monte. A Bia, o Gui, e todos nós, adoramos sentir a natureza no seu estado mais puro.  

Fundação ADFPA 20 minutos dali, outra atracção, esta já bem mais conhecida, as Ruínas de Conimbriga.  O conjunto de todas estas ruínas, o Museu Monográfico (construído nas imediações) e o castelo de Alcabideque consubstanciam um complexo arqueológico de peso mundial e que permite a reconstrução de uma importante era do grande Império Romano. 

Fundação ADFPQuando falei com o director da ADFP para preparar esta visita, o José Miguel informou-me que apesar de toda esta atmosfera de beneficência, bondade e inclusão cultivada nos seus espaços, queria que a nossa crítica deixasse isso de lado e se focasse  na excelência do que por ali se fazia.  No entanto, nestes 3 dias aprendi que por vezes o importante não é tanto o que fazemos, mas o motivo pelo qual fazemos, é isso que faz com que, contudo, ela, a bondade, se continue a mover ;)

O mais sincero obrigado a todos vocês que  tornaram estes 3 dias ... sussurrantemente bondosos!!!

Kopke 10 anos Branco e Tawny | O teste da lágrima

"Encontrei uma preta, que estava a chorar, pedi-lhe uma lágrima para a analisar. Recolhi a lágrima, com todo o cuidado, num tubo de ensaio, bem esterilizado...  Ensaiei a frio, experimentei ao lume, de todas as vezes deu-me o que é costume: Nem sinais de negro, nem vestígios de ódio. Água (quase tudo) e cloreto de sódio."  António Gedeão

KopkeO belo poema “Lágrima de Preta" foi escrito por António Gedeão, pseudónimo do professor Rómulo de Carvalho. Apaixonado por ciência, Rómulo de Carvalho cedo se interessou pela racionalização daquilo que o rodeava, não sendo por isso surpresa que tenha escolhido o curso de "Ensino de Física e Química" para a sua formação superior. Uma pequena nota, antes de continuar, apenas para referir que este nobre curso, é tido por muitos como o melhor que alguma vez já existiu. ;)

KopkeApós concluir este dificílimo curso, Rómulo de Carvalho começa por estagiar no liceu Pedro Nunes e ensinar durante 14 anos no liceu Camões, ambos em Lisboa, sendo mais tarde convidado para dar aulas no liceu D. João III, em Coimbra, permanecendo aí até, passados 8 anos, regressar a Lisboa, para assumir o cargo de professor formador do grupo de Física e Química no liceu Pedro Nunes. Exigente, dedicado e comunicador por excelência, para Rómulo de Carvalho ensinar era mais que um trabalho. "Ser Professor tem de ser uma paixão - pode ser uma paixão fria mas tem de ser uma paixão. Uma dedicação", dizia ele.

KopkePara além desta evidente paixão, este homem multifacetado realizou-te também com investigador, historiador, escritor, fotógrafo, pintor e ilustrador.  Apesar de toda esta intensa e diversificada actividade, Rómulo de Carvalho escondia outro talento em forma de amor pelas palavras "rimantes": a poesia. Porém, pensando que a sua obra poética não possuía qualidade suficiente (não podem esquecer que para alguém com aquele curso, a exigência está sempre no nível máximo ;)) resolve não a tornar pública, chegando mesmo a destruir boa parte dela.

KopkeSó em 1956 (Rómulo de Carvalho nasceu em 1906), após ter participado num concurso de poesia, publica o primeiro livro de poemas chamado Movimento Perpétuo. No entanto, o livro aparece como tendo sido escrito por outra pessoa, um tal de António Gedeão, remetendo Rómulo de Carvalho para o anonimato a que se votou. Este primeiro livro é aclamado pela crítica levando a que Rómulo de Carvalho através de António Gedeão, continuasse a publicar poesia, aventurando-se, depois, no teatro e anos mais tarde, no ensaio e na ficção. A obra de Gedeão permanece um enigma para os especialistas, uma vez que surgiu, estranha e incomummente, apenas aos 50 anos, e com um estilo muito particular, que não se enquadra de modo óbvio, em qualquer movimento literário.

KopkeSe ainda assim quiséssemos encontrar uma categoria para catalogar a poesia de Rómulo de Carvalho,  diríamos que este poeta procurava dar enquadramento geracional aos problemas comuns da sociedade portuguesa existentes na sua época. As suas palavras conciliam de modo sublime a poesia com a ciência, a realidade com o sonho e o pragmatismo com a esperança. Apesar destes conceitos "bipolares" parecerem antagónicos, em Gedeão, provinham da mesma fonte e completavam-se, e esta é a parte mais bonita da sua obra.

KopkeEstas características são levadas ao expoente máximo no poema "Lágrima de Preta", onde o poeta analisa,  em forma de relatório científico, a lágrima de uma mulher preta, testando-a e concluindo que essa lágrima era igual à de toda a gente, sendo a sua natureza independente da cor da pele.  Rómulo de Carvalho lutou através das palavras pela igualdade de direitos, de deveres, de sonhos e de esperança. A  sua visão clareada pela luz da ciência e da bondade, tem muita actualidade, num mundo onde a vida batalha contra a morte, a liberdade contra a opressão, a integridade contra a aparência e a inteligência contra a estupidez: mas com armas de calibre bastante diferente. 

KopkeHá quem o recorde como o alquimista dos sonhos e da igualdade. Mas também como promotor das mais valias resultantes da diferença e da identidade. Foi também quem criou uma espécie de "teste da lágrima" com o qual devemos avaliar a integridade, os valores, a diferença e a identidade de uma pessoa em deterimento da sua cor. Dado que para Rómulo de Carvalho o sonho também era vinho (facto bem demonstrado na Pedra Filosofal ou na Estrela da Manhã), um bom exemplo do respeito pelas diferenças numa matriz de igualdade é o vinho do Porto. ;) 

KopkeHá-os para todos os gostos, brancos, Tawnys, tintos e até rosas. Hoje falo-vos de dois deles, ambos da Kopke, o 10 anos Branco e o 10 anos Tawny, que nos mostram que aquilo que somos é bem mais complexo do que a cor com que nos possamos apresentar. Como o próprio nome indica, as uvas que lhes dão origem são diferentes, num caso brancas e noutro tintas. Têm, no entanto, o mesmo tipo de estágio, em madeira durante períodos de tempo variáveis, nos quais a idade mencionada no rótulo corresponde à média aproximada das idades dos diferentes vinhos participantes no lote, neste caso 10 anos, expressando o carácter do vinho no que respeita às características conferidas pelo envelhecimento em casco.

KopkeO Kopke Porto Branco 10 Anos (30.00 €, 92 pts.) traja uma elegante cor amarela-dourada. No nariz é muito complexo, com notas a amêndoa, nozes, damasco, laranja, canela, tosta e caixa de tabaco. No palato é redondo, delicado, crocante, longo e exibe um bom equilíbrio entre doçura e acidez. Ligou lindamente com uma Terrine de foie gras e pera bêbada. Por sua vez o Kopke Porto Tawny 10 Anos (25.00 €, 88 pts.), rubi-âmbar, exibe aromas a ameixa seca, figos secos, nozes, amêndoas, cravo e melaço. 

KopkeNa boca passeia-se com volume, intensidade, complexidade, frescura e suavidade. Combinou muito bem com um Pão de ló com amêndoa.   Espero que com este texto, não me acusem de racismo devido às classificações que atribuí aos vinhos. ;) O certo é que preferi o Branco, por ser muito diferenciado daquilo que normalmente encontramos.

Quer o Branco quer o Tawny demonstram bem a arte secular do blend no Vinho do Porto construída pela Kopke. A elevada exigência na escolha das uvas, aliada à selecção cuidadosa de cascos de diferentes anos e de qualidade extrema, faz com que estes vinhos se diferenciem e se tornem absolutamente sedutores: História, exclusividade, diferença e identidade fazem com que estes vinhos tenham passado no teste da lágrima ;)

 

Terrine de foie gras e pera bêbada:

-Façam uma compota com maça e figos, acrescentando um pouco de Vinho do Porto Branco;

-"Pintem" o  foie gras com a compota anterior e polvilhem com amêndoa;

-Cubram a parte superior com a compota restante e um pouco de ameixa confitada (do caldo da pera bêbada).

-Para a pera bêbada descasquem as peras inteiras (cortando a base de modo a que depois seja mais fácil empratar) e cortem um pouco de ameixa vermelha, regando tudo com um pouco de sumo de limão. Levem a fruta ao lume com o açúcar amarelo, vinho do Porto Rubi e alguma água (a quantidade de água deve ser metade da de vinho). Juntem um pau de canela e anis estrelado. Depois de estarem cozidas, sirvam-nas bem frescas.

Pão de ló com amêndoa:

-Preparem o recipiente onde vão cozer o pão de ló, forrando-ocom papel de levar ao forno;

-Deitem 5 ovos ,10 gemas, 150 g de amêndoas palitadas e 250 g de açúcar numa tigela e misturem tudo durante meia hora com o auxilio de uma batedeira;

-Juntem ao preparado anterior 200g de farinha peneirada, aos poucos, envolvendo subtilmente com a ajuda de uma colher de pau. Deitem o preparado no recipiente, tapando com papel de alumínio e levem a cozer no forno a 225ºC, durante aproximadamente 35 minutos.

AdegaMãe 221 2017 | Entrelinhas de expressão

"Eu gosto do estranho, do incomum. Gosto daquilo que confunde, que permite diferentes interpretações, que fica nas entrelinhas." Martha Medeiros

Adega Mãe 221 2017 A nível europeu, os "vinhos de topo" são normalmente sinónimo de vinhas especificas, produtores com pedigree ou de regiões afamadas, todos eles com um evidente terroir único. Mas não na Austrália, cujos produtores de vinho são provavelmente os mais inovadores e também os mais livres de preconceitos. Pensemos num dos vinhos australianos mais icónicos: o Penfolds Grange BIN 95...

Adega Mãe 221 2017 O intuito inicial deste Penfolds Grange era o de “ser como um dos melhores Bordéus”, capaz de envelhecer nobremente por um bom par de décadas. Em 1949, o seu criador, o enólogo Max Schubert, visita Bordéus e a Borgonha, apaixonando-se pelos blends franceses. Regressa depois à Austrália, determinado a produzir vinhos com a mesma complexidade e capacidade de envelhecimento. Para tal teria de seleccionar a melhor casta (a sua escolha recaiu na Syrah), avaliar o melhor terroir e conjugar parcelas de diferentes vinhas de modo a que se complementassem no vinho final. 

Adega Mãe 221 2017 Após inúmeras tentativas, Max Schubert apercebeu-se que só havia uma maneira de atingir o seu objectivo: tinha de misturar uvas de 3 regiões diferentes. Este vinho estranho e incomum desencadeou uma onda de inovação, optimismo e ambição na Austrália do pós-guerra, onde a ciência inovadora do químico-vínico Ray Beckwith e a vinificação irreverente de Max Schubert colidiram de frente com as forças conservadoras, resistentes e de "vistas curtas", que por vezes estão presentes no sector do vinho. A verdade é que o Penfolds Grange foi conquistando apreciadores, ganhando concursos e quebrando preconceitos. 

Adega Mãe 221 2017 Hoje em dia é um dos vinhos australianos mais caros (na casa dos 500 euros) e é mundialmente conhecido pelo seu perfume concentrado e intenso, taninos maduros e notas deliciosas a madeira resultantes do envelhecimento em barricas novas de carvalho americano durante 20 meses.  Nos seus melhores anos cresce irrepreensivelmente em garrafa durante meio século!!! É estranho que num país como o nosso, conhecido pelos seus blends, esta prática disruptiva não ter tido mais acolhimento. Uma das felizes excepções é o AdegaMãe 221

Adega Mãe 221 2017 Um vinho assinado pelos enólogos Diogo Lopes e Anselmo Mendes, num exercício que reedita a viagem desta variedade por terroirs distintos, e que integra um blend com 50% de Alvarinho da AdegaMãe (Torres Vedras, na Região de Vinhos de Lisboa) e 50% de Alvarinho de Anselmo Mendes (Monção, na Região dos Vinhos Verdes). O seu objectivo era o de expressar conjuntamente o perfil mais austero de Monção e a salinidade tão particular de Lisboa: duas regiões, dois enólogos, uma casta. Na edição de 2017, após a fermentação em madeira e seleccionadas as melhores barricas, os dois lotes, foram integrados na AdegaMãe, iniciando um estágio de três anos em garrafa. 

Adega Mãe 221 2017 Todo este tratamento VIP fez com que o AdegaMãe 221 2017 (25.00 €, 91 pts.) trajasse um amarelo palha muito sedutor, exibindo no nariz, bastante complexo, pera, casca de laranja, jasmim, lichias, mel, subtis brisas salgadas, um delicioso maçapão e umas notas fumadas muito bem integradas. No palato para além de uma textura crocante mostra um excelente volume. É muito fresco, estruturado, untuoso e muito equilibrado. Mas tem ainda mais qualquer coisa. É um vinho que "confunde", que permite diferentes interpretações, que fica nas entrelinhas e eu gosto disso. Foi o par ideal para "dançar" com um Rolo de tamboril e presunto, lentilhas e espuma de marisco

Adega Mãe 221 2017 Ressalvo ainda que esta abordagem deve, na minha opinião, apenas ser considerada para os "extremos de valor da cadeia vínica", ou para os mais acessíveis em que o consumidor não está propriamente preocupado com o conceito de terroir, ou para vinhos de topo onde o consumidor percebe que a vitivinicultura de precisão e a enologia inovadora têm necessariamente de ser reflectidas no preço final do vinho. Dito isto, aquilo que o AdegaMãe 221 2017 nos proporciona é bem maior do que aquilo que se tem de pagar por ele.  

 

Rolo de tamboril e presunto, lentilhas e espuma de marisco:

-Temperem os pedaços tamboril com sal, pimenta e um pouco de noz-moscada. Enrolem-nos em presunto e levem-nos ao forno durante 10 minutos a 220ºC;

-Cozam as lentilhas em água, acrescentando sal e uma folha de louro. Depois de estarem cozidas coem-nas e levem-nas a saltear levemente (1 minuto) em azeite, alho e um pouco de toucinho fumado. Temperem com pimenta e um pouco de brandy;

-Fervam durante 20 minutos umas cabeças e cascas de camarão em leite. Depois do preparado anterior arrefecer, façam uma espuma com um auxilio de uma varinha mágica (eu usei a Aeroccino da Nespresso).

Pena Park Hotel & SPA | A vida secreta das árvores

"Nunca o homem inventará nada mais simples nem mais belo do que uma manifestação da natureza. Dada a causa, a natureza produz o efeito no modo mais breve em que pode ser produzido." Leonardo da Vinci

Pena ParA vida secreta das árvores: O que elas sentem e como se comunicam, de Peter Wohlleben é daquele tipo de livros que "uso" para ler entre leituras de assuntos que normalmente me interessam (clássicos, thrillers e históricos ou então sobre cultura, viagens, vinhos e gastronomia). É um livro baseado na ciência e em experiências pessoais, que se lê bastante rápido, cujos capítulos são bastante pequenos (5-10 páginas) e em que a escrita é bastante fluente. No final ficamos a perceber que temos mais em comum com as árvores do que aquilo que inicialmente possamos supor. 

Pena ParkIdeias aparentemente irrealistas, como a das árvores poderem falar umas com as outras, a de necessitarem de dormir, a de terem família e amigos e a de por vezes gritarem, no final da leitura vão-vos parecer muito lógicas.  Wohlleben passou sua carreira como engenheiro florestal a gerir uma enorme floresta nas montanhas Eifel, na Alemanha, e a paixão que cultivou pelas árvores chega a ser contagiante. A sua escrita gira em torno do facto de que, apesar das árvores crescerem lentamente e de viverem muito mais tempo do que nós, compartilham com os humanos uma quantidade notável de características. 

Pena ParkPor exemplo, as raízes de umas árvores ligam-se às raízes de outras árvores nas florestas, até mesmo de outras espécies, para compartilharem nutrientes, água e alertas sobre predadores. Embora as árvores tenham inúmeras maneiras de competir entre si pela obtenção da luz solar disponível, elas são seres surpreendentemente sociais cujo bem-estar depende, sobretudo, do quão forte e unida é a sua comunidade. Essa comunidade não se limita apenas a árvores, inclui também fungos, insectos, pássaros, líquenes ou plantas. As mais valias  da escrita de Wohlleben residem não apenas na sua vida dedicada ao conhecimento e à devoção às florestas, mas também na sua capacidade fantástica de despertar a atenção no leitor.

Pena ParkApesar deste clima aparentemente saudável entre árvores, na floresta, por vezes a vida é uma selva... Algumas árvores são extremamente egoístas na capacidade de absorver o máximo de radiação solar disponível, como as faias, que conseguem captar 97% da luz que lhes chega do Sol (isso não é uma boa notícia para as pequenas árvores que precisam da mesma luz solar e que por acaso crescem por debaixo de uma faia). Os carvalhos produzem muitos taninos na sua superfície exterior para desencorajarem possíveis "dentadas" de fungos. 

Pena ParkAlguns pinheiros armazenam resinas, uma espécie de óleos essenciais nas suas agulhas e troncos, de modo a estas servirem de anticongelantes mas também de os ajudarem a manterem-se saudáveis ​​durante invernos mais rigorosos. O inteligente álamo-tremedor deve o nome às suas folhas, que por possuírem um caule triangular conseguem-se mover em função da mais ténue brisa, ajudando esta árvore a produzir mais energia, uma vez que ambos os lados das suas folhas são capazes de fotossintetizar. 

Pena ParkExistem ainda alegorias deliciosas como o facto das árvores urbanas serem consideradas "crianças de rua", das copas superiores das árvores serem vistas como "escritórios executivos", de ao nível ultrassônico as árvores vibrarem no tronco quando sentem falta de água (quase como que a gritar por ajuda) ou então de quando as folhas caiem no Outono isso significar que as arvores estão a adormecer.  A privação de sono afeta as árvores e as pessoas da mesma maneira: é fatal. É por este motivo que os carvalhos e faias não crescem da mesma forma durante todo o ano. 

Pena ParkPara mim, a parte mais bonita do livro está no capitulo em que são esmiúçados os detalhes da partilha de nutrientes por parte das árvores. É hoje cientificamente aceite o facto das árvores compartilharem nutrientes mais facilmente com outras árvores que possuam a mesma composição genética, ou seja, com aquelas que podem ser consideradas a sua família. Para além disso, e apesar da partilha de luz/nutrientes/espaço numa comunidade de árvores acabar por beneficiar individualmente cada árvore, cada uma delas tem uma "lista de amigos" com quem essa partilha é efetuada preferencialmente. 

Pena ParkVários estudos científicos dedicaram-se, infrutiferamente, a tentar perceber esta relação preferencial, mas não chegaram a nenhuma conclusão. Também nós humanos não temos um conjunto de caraterísticas que na globalidade definam o que é ser "nosso amigo". São nossos amigos quem nós gostamos, ponto.  Ainda na temática da partilha de nutrientes, as árvores cuidam dos membros mais doentes ou moribundos da comunidade, passando nutrientes através seu extenso sistema de raízes interconectadas.

Pena ParkAlgumas árvores especiais, mesmo quando reduzidas a tocos, continuam a ser nutridas pela floresta circundante durante séculos!!! Melhores amigos que estes só mesmo aqueles que nos emprestam "abnegadamente" dinheiro para vivermos em Paris, "à grande e à francesa". ;)  O livro discute ainda a importância de algumas florestas antigas como a floresta tropical de Great Bear, no norte da Colúmbia Britânica, que cobre os ainda impressionantes 65.000 quilómetros quadrados, deitando-se ao longo da costa do Pacífico.

Pena ParkMais de um terço dessa área é coberto por árvores muito velhas, que fornecem o habitat necessário para o raro urso de Kermode (um urso preto com pelo branco, desconfio que este urso seja vitoriano ;)). Estas florestas antigas possuem um solo macio e húmido, rico em nutrientes e promotor de ecossistemas saudáveis. Conservar estas  florestas não é bom apenas para os ecossistemas,  é fundamental para nós humanos.

Pena ParkMas se o "simples gesto altruísta" de deixarmos um mundo melhor e mais sustentável para os nossos filhos não é suficiente, o livro mostra-nos como é possível conciliar a importância da conservação das florestas com a obtenção de algum lucro económico nessa acção, através da educação, da cultura e do turismo. 

Pena ParkTambém a nossa saúde pode sair fortalecida quando "turistamos" perto das árvores,  isso graças aos fitoncidas, liberados por algumas árvores, um produto químico com propriedades antibióticas que para além disso dá às florestas aquele aroma característico dos dias de Verão no bosque. Isto que significa que as árvores desinfetam e perfumam quem as rodeia. 

Pena ParkVoltando à ciência, um estudo realizado com mulheres coreanas mais velhas rastreou as suas caminhadas em florestas e em áreas urbanas. Veio-se a descobrir que a pressão arterial, a capacidade pulmonar e a elasticidade das artérias melhoraram no "grupo floresta", mas não no "grupo cidade". Como afirma Wohlleben, cada caminhada na floresta é como tomar um banho de oxigênio. 

Pena ParkMas atenção, estas caminhadas são benéficas apenas durante o dia. As árvores não fotossintetizam à noite, e em vez de estarem a libertar oxigénio passam a consumi-lo. Mas também, que raio é que um grupo de idosas coreanas andaria a fazer à noite, sozinho, na floresta? ;) Foi para perceber um pouco mais sobre esta vida secreta das árvores que abraçamos a natureza no Pena Park Hotel.

Pena Park Está a apenas 15 minutos da famosa EN2 (a partir de Vila Pouca de Aguiar), um desvio justificado pelo contexto autóctone do hotel, pelo seu conforto, pelos espaços de lazer, pelas piscinas reconfortantes e pelo bem estar induzido pelo SPA Natureness com vista fantástica para a floresta. Neste podemos ainda encontrar uma piscina coberta , sauna com vista para a natureza, banho turco, salas de massagem e relaxantes tratamentos de SPA.

Pena ParkComo é óbvio e não poderia deixar de ser, a gula também teve algo a ver com esta visita. ;) O restaurante do hotel, o Biclaque com a assinatura do Chefe Vítor Miranda é super afamado pelas suas sobremesas. A paisagem natural envolvente proporciona-nos um enquadramento perfeito para desfrutar dos sabores da região enquanto nos deliciamos com paladares mediterrânicos reinventados numa oferta gastronómica única e enriquecida pelos sabores de S. Tomé e Príncipe, como resultado de uma viagem recente do Chefe.

Pena ParkApesar de todo o menu apresentar sentido, alma e tradição, destaco a frescura dos peixes (Salmonete e Robalo), a alegria do Ceviche, a riqueza, sabor e originalidade na apresentação da Alheira, a textura da suculenta Costela de Novilho maturada e claro, o alto nível das sobremesas.  

Pena ParkDesde o Irashaimase (uma espécie de bola de Berlim gourmet e fina), até ao S. Tomé com espuma de baunilha de S. Tomé, calda da polpa de cacau, macarons com café arábica, base de chocolate a 100% e sementes de cacau (e mais uns 10 elementos... ;)) passando pela deliciosa e abastada Tarte sablé de framboesa com gelado de morango e pimentão e espuma de morango, tudo é genuinamente electrizante. Para harmonizar este repasto sugerimos os vinhos regionais de qualidade excepcional constante na carta, desde os vinhos do Porto, até aos tintos/brancos do Douro, passando pelos verdes da Região do Minho.

Pena ParkPara além da comunidade de árvores que circunda o hotel e cuja zona florestal protegida é uma das mais selvagens da Europa, com uma enorme diversidade de fauna e flora, podemos encontrar na vizinhança do Pena Park Hotel & SPA,  planaltos e montanhas majestosas, vilas e aldeias históricas intocadas, águas termais purificantes e curadoras, cozinha tradicional e a hospitalidade genuína de um povo orgulhoso dos seus costumes. Este hotel, para além de tudo o que já vos relatei, oferece ainda a todos os que o visitam, um serviço profissional, próximo e competente, para além de um clima de segurança muito importante nos dias que correm.

Prova Quinta do Noval | A irmandade do tonel

"Para fazer uma obra de arte não basta ter talento, não basta ter força, é preciso também viver um grande amor.“  Wolfgang Amadeus Mozart

Noval 17/18No século XVIII, Mozart fez uma digressão pela Europa, encantando o público um pouco por todo o continente, impressionando os mais exigentes críticos. Havia mesmo quem dissesse que aquela música era a melhor que tinham ouvido e que Mozart tinha um futuro muito promissor pela frente. Quando se "fala" em Mozart, a grande maioria das pessoas pensa imediatamente em Wolfgang Amadeus Mozart. 

Noval 17/18A história concedeu-lhe o título de gênio por excelência. Logo desde pequeno, Wolfgang já havia escrito composições notáveis mas é a sua maturidade musical adquirida numa digressão pela Europa, ainda enquanto criança, que o leva inevitavelmente, a atingir momentos musicais sublimes. Tudo isto é verdade, mas...

Noval 17/18A referência a Mozart com que comecei esta publicação não era destinada a Wolfgang, mas sim à sua irmã Maria Anna Mozart, também conhecida por Nannerl. Nannerl participou com o seu irmão, o pai Leopold e a mãe Anna Maria na famosa viagem (iniciada em 1763) da família Mozart pela Europa, uma longa excursão musical pelas capitais e principais cidades do velho continente com vista (aparentemente) a amealhar algum dinheiro com os concertos destinados à realeza, às famílias nobres e, por vezes, às classes mais baixas da sociedade. 

Noval 17/18O itinerário levou os Mozart a passar por Munique, Frankfurt e Bruxelas. De lá, viajaram para Paris e, após uma longa estadia de cinco meses na capital francesa, partiram para Londres, onde permaneceram por uns impressionantes 15 meses. Em Londres, a família Mozart conheceu alguns dos principais músicos da época, ouviu muita (e boa) música e Wolfgang compôs as suas primeiras sinfonias, com a ajuda da irmã. Depois, os Mozart passaram pelos Países Baixos. A viagem de regresso incluiu uma nova paragem em Paris e um passeio pela Suíça, antes que a família voltasse a Salzburgo, em Novembro de 1766. Em todos os lugares onde actuaram, os dois irmãos geravam comentários de entusiasmo e espanto.

Noval 17/18A pequena Nannerl costumava receber mais elogios e dinheiro do que o seu irmão e por vezes Wolfgang pedia-lhe que ela lhe ensinasse os seus truques musicais. Há historiadores que defendem que este era o real objetivo do pai Leopold, que Wolfgang absorvesse a genialidade de Nannerl enquanto tocavam juntos.  Entre os testemunhos que sustentam esta "desconfiança" existem algumas noticias sobre os concertos dados pelos dois irmãos em 1763 em Londres. 

Noval 17/18Em particular, descrições do belíssimo domínio que Nannerl exibia no cravo e no piano, que deixou  Wolfgang de "ouvido caído".  A menina foi fortemente elogiada tanto pelo público quanto pela crítica, que se apaixonaram pela sua leveza e mestria. Com o avançar da idade, o pai Leopold começa a encaminhar Nannerl para o "percurso natural" das meninas que queriam ser bem sucedidas: o casamento.  

Noval 17/18Wolfgang tornou-se Mozart e Maria Anna tornou-se esposa de alguém.  Wolfgang morre de uma doença misteriosa anos mais tarde, em 1791, e isso pareceu despertar Nannerl para o relacionamento/música que eles haviam cultivaram no passado. Foi por isso que Nannerl se dedicou à escrita da biografia do seu irmão, dando-nos muitos detalhes divertidos sobre o génio que ela conhecera, fomentara e amara. Apesar de detestar a cunhada e com razão (mas essa história fica para uma próxima publicação), Nannerl deixou isso de lado para trabalhar com Constanze na biografia de Wolfgang. 

Noval 17/18É graças a estas duas "queridas inimigas" que hoje sabemos um pouco mais sobre o génio Wolfgang Mozart.  Mais tarde, ela escreveu que, ao ler sobre o seu irmão, os seus sentimentos de irmã foram completamente reavivados, uma vez que para Nannerl, o afecto para com o menino que tanto se esforçava para imitar a sua irmã nunca tinha realmente desaparecido, e agora ela iria fazer de tudo para preservar a sua memória e promover o seu legado. 

Noval 17/18Temos muito a agradecer a Nannerl, pois foi o período após a morte de Wolfgang que a sua reputação cresceu, com a ajuda do que a "menina" escreveu. Nanner chegou mesmo a entregar toda a sua correspondência privada para atrair ainda mais atenção para o seu irmão. Em 1829, a autora inglesa Mary Novello (motivada pelos relatos da genialidade da "menina" Mozart) visitou a já envelhecida Nannerl,  ficando chocada com o que descobriu: Nannerl estava cega, cansada, pobre e sisuda. Nesse mesmo ano, Nannerl morreu aos 78 anos.

Noval 17/18No entanto, Novello estava errada. Como tantas vezes acontece, as aparências enganaram: Nannerl não era pobre, deixou uma grande fortuna para trás, mas optou por viver com frugalidade. A falta de empatia que Novello relatou era explicada pela necessidade que Nannerl tinha em se ausentar do mundo real, para procurar na sua mente episódios aparentemente esquecidos que ajudassem a engrandecer ainda mais o seu irmão. Esta "menina velha" viveu até ao seu último dia como bengala do grande génio.

Noval 17/18Esta história sobre os Mozart tem imensos detalhes com implicações que vão muito para além da música. A primeira é a de que quando consideramos algo melhor que outro, temos de prestar atenção aos detalhes, sob a pena de sermos injustos. Outra é a de que por vezes as aparências não só iludem como podem tornar as surpresas ainda mais "saborosas". A última e a mais importante, é que quando se nasce no mesmo lugar, em diferentes anos e apesar das diferenças que possam existir, há sempre algo maior que acaba por unir os "irmãos", isso também é verdade nos vinhos. Se não acreditam nisso, estejam atentos aos próximos parágrafos. ;)

Noval 17/18Com o objetivo de comparar o genial ano de 2017 com o "desconhecido" 2018 a Quinta do Noval promoveu, no passado dia 31 de Março, uma apresentação online. Durante a prova foi possível ainda descobrir a nova colheita do Cedro do Noval branco (2020) e o maravilhoso Quinta do Noval Porto Colheita 2007. Tudo música para os meus ouvidos. ;) 

Noval 17/18O Cedro do Noval Branco 2020 (14.50 €, 91 pts.) é provavelmente a melhor edição deste vinho. De cor dourada clara e cristalina exibe aromas complexos a pêssego, anis, toranja, limonete, flores brancas e baunilha. No palato tem bom volume, excelente acidez, equilíbrio e uma ligeira untuosidade que lhe fica muito bem.  Acompanhou na perfeição um Bacalhau fresco com berbigão.

Noval 17/18Nos tintos, o Cedro do Noval Tinto 2017 (14.50 €, 90 pts.) exibe uma cor rubi escura, tem um nariz muito interessante com pimenta preta, chocolate e ameixa preta. No palato proporciona um final muito expressivo, aromático, ligeiramente fumado, fresco e muito rico. Exprime bem a excelência de 2017. Por sua vez o benjamim Cedro do Noval Tinto 2018 (14.50 €, 89 pts.) de cor rubi densa, menos exuberante que o 2017, carrega notas a morangos, chocolate preto, ameixa preta e uma brisa fumada. Na boca é fresco (mais elegante que o 2017), longo e muito equilibrado. 

Noval 17/18Seguiu-se um dos Tourigas que mais me seduz, o rubi-violeta Quinta do Noval Touriga Nacional 2017 (30.50 €, 92 pts.). Mostra-se exuberante sem ser demasiado perfumado, com aromas florais (pétalas de rosa), violetas, framboesas, bergamota, fruta do bosque madura, notas minerais (xisto partido), um toque achocolatado, pimenta preta e com uma espinha dorsal taninica bastante firme. A nova edição, o Quinta do Noval Touriga Nacional 2018 (30.50 €, 91 pts.) de traje violeta, tem a madeira um pouco mais presente, mas o foco continua a estar nas notas florais a violetas, na cereja e na pimenta preta. 

Noval 17/18Surgem também um pedrogosidade e um achocolatado que tornam o vinho um pouco mais intrigante. Na boca, o equilíbrio, a frescura e a profundidade continuam a ser as notas dominantes. Para acompanhar o Lombo de porco, gelado de beterraba, legumes baby, compota de tomate e funcho preferi o Quinta do Noval Touriga Nacional 2018 devido à acidez mais vincada. Nesta prova, pude voltar a "conversar" com o fantástico Quinta do Noval Reserva 2017 (51€, 94 pts.).

Noval 17/18 No copo é rubi muito denso, no nariz é intenso com groselha, framboesas, ameixa preta e pimenta preta. Exibe ainda uma mineralidade (xisto partido) muito agradável, uma tosta bem integrada e chocolate preto. Na boca passeia-se com taninos deliciosamente saborosos, potência e estrutura. Um vinho enorme que tem tudo para continuar a crescer em garrafa. O ano de 2018 fez com que Quinta do Noval Reserva 2018 (51€, 94 pts.) adquirisse um pouco mais de finesse.

Noval 17/18 A fruta é mais fresca (mirtilos), e a framboesa não está tão presente. A alma "Noval Reserva" continua lá com a pedrogosidade, com a madeira e com o chocolate preto. Na boca é um vinho cheio, complexo e super equilibrado.  Estava à espera de gostar muito mais do 2017 mas isso não aconteceu, apesar de uma maior evolução do 2017. Para acompanhar um Crème brûlée nada melhor que o Quinta do Noval Colheita 2007 (52€, 94 pts.), um vinho que procura democratizar a excelência dos vinhos do Porto.

Noval 17/18 Traja um âmbar super sedutor e exibe um nariz arrebatador, com um equilíbrio muito bonito entre a fruta mais fresca (limão e toranja), o ligeiro vinagrete e frutos secos (ameixa, amêndoa torrada e noz). Na boca surgem as especiarias (canela), uma boa estrutura, uns taninos de veludo e uma excelente frescura.  Quem diria que numa "guerra" entre 2017 e 2018 ganharia ... 2007. ;)  Nem tudo que é genial, tem forçosamente de ter um preço incomportável, este vinho é um bom exemplo disso. Querem saber qual o problema deste vinho? Foram produzidas apenas 3000 garrafas.

Noval 17/18Apesar do ano de 2017 ter tido condições climatéricas que permitiram a produção de vinhos memoráveis (um inverno frio e seco, seguido de uma Primavera e Verão excecionalmente quentes e secos, Junho foi mesmo o mês mais quente desde 1980, com temperaturas que atingiram os 42-44°C no vale do Douro durante a onda de calor sentida entre os dias 7 e 24 de Junho!!!) os colheitas de 2018 mostram características que valem a pena ser conhecidas, como a sua finesse, elevada frescura e um excelente trabalho com a barrica. 2017 deu mais trabalho a S. Pedro, 2018 deu (muito) mais trabalho à equipa de enologia. ;) 

Noval 17/18É ainda muito enriquecedor poder provar vinhos dos dois anos lado a lado, pois há uma certa irmandade da vinha e do tonel que lhes dão a mesma coluna vertebral: o equilíbrio, a identidade, a elegância e a complexidade. Para além disso, não sejamos como o pai Leopold Mozart que à partida já sabia quem seria o eleito. Vamos dar tempo ao vinho e voltar a conversar daqui a uns anos, sem pressas. ;) É também por isso que para fazer vinhos desta qualidade, ano após ano, não basta ter talento e não basta ter força, é preciso mais qualquer coisinha...

 

 

Lombo de porco, gelado de beterraba, legumes baby, compota de tomate e funcho:

-Cozam as beterrabas já descascadas em águal e sal (reservem uma para levarem ao forno). Triturem-nas e juntem um pouco de ginja, açúcar mascavado, natas magras, sal e sumo de um limão e cozinhem por 2 minutos. Levem ao congelador para usarem mais tarde (necessita de pelo menos 4 horas antes de ser servido);

-Levem ao forno rodelas da beterraba cozida, talinhos de funcho e cenouras baby (20 minutos a 180ºC);

- Num tacho coloquem os tomates previamente cozidos e sem casca, açúcar e um pau de canela. Mexam e deixem cozinhar em lume moderado durante 1 hora. No final triturem o tomate, juntem sumo de um limão e um pouco de Porto Ruby;

-Grelhem o lombo de porco em azeite, sal, pimenta, louro, pimentão e uma estrela de anis.

Barão Fladgate | Serotonina, um sonho em lume brando

"Valor é o preço que pagamos por algo que achamos ser essencial. Preço é a unidade monetária para algo essencial ao qual não damos valor.” Eliasar

Barão FladgateSe vos perguntasse qual o motivo pelo qual comem e a vossa resposta fosse para “sobreviver” bloquear-vos-ia automaticamente. ;) Isto porque estariam a comparar o nosso corpo a um simples carro, sendo a comida o gasóleo que é queimado para produzir energia. Mas se costumam ler este blogue sabem que a comida e o acto social/cultural de comer é muito maior que a simples necessidade fisiológica.

Barão Fladgate Com certeza que já repararam na dose extra de felicidade que é distribuída pela vossa mente quando vos é apresentado o vosso prato favorito. A mim acontece-me frequentemente com uma boa feijoada, foie-gras, ostras ou tarte tatin (só para falar de alguns ;)). A simples observação de certos alimentos liberta muito mais que saliva, segrega também algumas substâncias químicas (como a serotonina) no cérebro, transmitindo uma sensação de bem estar. Mas não se preocupem, hoje, não vos vou melgar com ciência. ;)

Barão Fladgate Para encontrarmos a tal serotonina basta pegar numas gramas de concentração, uma pitada de criatividade, alguns raminhos de foco e umas colheradas de amor pelos outros. O resto da receita é fácil, misturar tudo delicadamente, levar ao forno a baixa temperatura e esperar que a felicidade suba até ao nível desejado. No final, há que desenformar e servir boa disposição em doses generosas, se bem que para algumas "personagens" doses minimalistas bastariam.  ;) 

Barão FladgateUm estudo (eu sei que tinha prometido que não falava mais em ciência, mas isto é só uma abordagem ao de leve e que não se voltará a repetir neste texto;)) no International Journal of Humanities and Social Science analisou as vantagens terapêuticas de cozinhar como um hobby, incluindo a capacidade de encurtar a perceção do tempo e aumentar a alegria. Esse estudo reportou que o acto de cozinhar melhora não só o bem-estar imediato mas que também está associado a uma maior satisfação com a vida. Além disso, os cientistas concluíram que cozinhar é o melhor indicador de felicidade subjetiva. 

Barão FladgateDesta forma, sobretudo numa altura de semi-confinamento, o tempo gasto na cozinha ao fazer um assado para a família ou para os amigos, pode ser exatamente o fermento necessário para a obtenção de uma maior felicidade e de um melhor bem-estar mental. Para além desta visão "egocêntrica" de cozinhar, há outra bem mais importante e transversal a todas as pessoas que gostam realmente de cozinhar, aquela que se cultiva quando o foco está nos outros... 

Barão FladgateCozinhar para outras pessoas é um admirável acto de amor, e ao contrário de outras vezes (;)), desta, não estou a exagerar, nem um pouco, nas palavras. Talvez estejamos demasiado acostumados a ver nossa mãe, o nosso pai, a nossa sogra ou a nossa esposa (esperem, a minha esposa não cozinha :P) a prepararem as refeições, que não nos apercebemos do quanto sentimento está envolvido neste nobre acto. Devemos parar e apreciar isso, verdadeiramente. 

Barão FladgateTodos nós sabemos que, quando se prepara comida para os outros, a maior recompensa que se pode receber pelos esforços empregues é ver que as pessoas à mesa desfrutam genuinamente do que lhes foi preparado. Dar comida às pessoas que se ama é um acto que vai muito além das necessidades biológicas do corpo pois não se trata apenas de despejar comida na frente das pessoas. 

Barão FladgateTrata-se de pensar de antemão no menu, de conciliar novidades com espectativas e gostos pessoais, de comprar antecipadamente os ingredientes necessários, de ter em consideração possíveis restrições alimentares, de pensar no valor nutricional de cada ingrediente, de cuidar da pessoa que precisa de energia e conforto para recuperar de uma doença, de ajudar a pessoa que está a tentar perder peso, ou de recompensar um amigo estafado depois de um dia de trabalho árduo.

Barão FladgateQuem cozinha para a família e amigos sabe que cozinhar significa pensar constantemente nos outros, e assim, cozinha-se tanto com as mãos como com o coração, porque geralmente quando se cozinha para outras pessoas temos como objetivo o de fazê-las felizes e contentes. Os Chefes, os bons Chefes têm sempre este lado emocional/sentimental da comida bem presente. Hoje "falo-vos" de um deles, o Chefe Ricardo Cardoso (do Barão Fladgate) que conjuga essa dimensão altruísta da cozinha com uma certa dose de surpresa no palato, alicerçada em sabores e harmonias contrastantes de uma cozinha pensada com minúcia para elevar a experiência e despertar o interesse dos sentidos.

Barão FladgateA nossa experiência começou com um "toca a reunir" sensorial, carregado de texturas,  intensidade, sabor e aparente simplicidade, a Lula e burrata cremosa com alface do mar desidratada. Seguiu-se um prato à Ricardo Cardoso: Robalo com cevadotto de milho, crocante de sementes, manteiga com Garam Masala e coentros, amêijoas à Bolhão Pato, espuma de água do mar e salicórnia da Ria de Aveiro.

Barão FladgateUm autêntico "autocarro panorâmico" disfarçado de comida. Permite uma viagem através das sensações, dos sabores e das emoções, por entre combinações inesperadas entre o cânone gastronómico português e algumas influências exóticas e orientais. Exibe uma mistura sublime da maresia do peixe e das ameijoas, do picante salgado da salicórnia, da elegância da espuma, da untuosidade do cevadotto e do perfume exuberante da Garam masala, tudo com conta, peso, medida e equilíbrio. 

Barão FladgateCom a Pintada recheada com frutos secos, castanhas e cogumelos silvestres, puré de rutabaga fumada e curcuma, gengibre rosa macerado, alho francês braseado, espargos verdes e molho de Kirsch regressamos ao conforto, ao sabor, à  frescura, ao foco na qualidade do produto e a uma complexidade que agrada tanto ao palato como ao intelecto. 

Barão FladgateExistem demasiados apontamentos não só de consonância mas também de contraste, entre os diferentes elementos que tornam a descrição do prato muito desafiante.   A riqueza carnuda da pintada foi enobrecida com os apontamentos umami dos cogumelos e realçada pela irreverência picante do curcuma. 

Barão FladgateO ligeiro fumo do puré e do alho francês, a excentricidade do gengibre rosa macerado e a brisa frutada do molho de Kirsch elevaram a complexidade do prato para um outro nível. Muito bom!!! Para acabar a refeição, nada melhor que a melhor sobremesa do ano passado aqui para o blogue: Chocolate 62% com praliné de amendoim e avelã, gelado de café Arábica, merengues de caramelo e toffee e sablé de chocolate.

Barão FladgateUma espécie de salada de frutos secos, café e chocolate, trajada de smoking e que ganhou complexidade ao nível da textura, apresentação, sabor e harmonia. Muito bem conseguida e extremamente prazerosa. Um hino à vida, aos sabores ricos e à boa comida, onde o chocolate é rei... Como costuma dizer um amigo meu, "comia disto todos os dias"!!! ;) Só há 3 Chefes em Portugal (que eu conheça) com visão/concepção/bagagem suficientes para pensarem uma sobremesa destas, dois são Michelin, o outro é o Ricardo cujo sonho estrelado se realizará um dia. ;)

Barão FladgateFalta falar ainda do espaço e das pessoas. Do espaço digo que os novos tons verdes e dourados, mais ecléticos e nobres, assim como o piso em madeira ficam muito bem ao Barão Fladgate. É elegante, acolhedor e potencia aquilo que já tinha no passado: uma arrebatadora vista sobre a cidade do Porto, com o Rio Douro, a Ponte D. Luís e o velho casario da zona ribeirinha como pano de fundo.

Barão FladgateDas pessoas que lá trabalham o melhor que posso dizer é que nos fizeram sentir "em casa" e em segurança numa altura em que a pandemia começava a complicar. Promovem um serviço bastante próximo, dedicado e competente, sem se tornar invasivo. Um bom exemplo disto aconteceu com o prato da Bia.

Barão Fladgate Quando lá chegamos a menina pediu-nos "massa preta com frango" e nós dissemos-lhe que não havia esse prato na ementa. A amicíssima, conversadora e empenhada Vera Monteiro, após servir outra mesa e sem que lhe tenhamos dito nada informou-nos que "apesar de não haver na ementa se arranjava". Passados 10 minutos a Bia estava desfrutar de um belo Peito de frango grelhado com tagliatelli nero. Escusado será dizer que a Vera ganhou logo ali uma aliada na mesa. ;) Destaque ainda para o serviço exemplar com os vinhos (execução, temperaturas, copos, doses e harmonizações como "mandam os livros").

Barão FladgateQuanto ao Chefe, que acompanhamos já desde o tempo em que era copeiro noutro espaço, não há muito mais que eu possa acrescentar para realçar a sua sustentável evolução. Apenas que alia de maneira muito harmoniosa, a destreza, a autenticidade, o perfeccionismo e a paixão a uma concepção gastronómica assente em fusões e contrastes equilibrados, sem descurar a procura da felicidade,  e isso não tem preço ... tem valor. ;) Por incompatibilidades de agenda não podemos estar no restaurante num dia em que Chefe Ricardo estivesse na cozinha, no entanto a qualidade não se ressentiu, e é isso que também ajuda a diferenciar um Chefe de um cozinheiro.

O Barão Fladgate deve reabrir brevemente, tudo isto merece a vossa visita!!!

Antónia Adelaide Ferreira 2016 | O ouro dos 300 mil

"O Douro visto daquele píncaro é o Paraíso prometido em todas as lições de catequese. É grandiosamente belo! As montanhas entrelaçam-se, magníficas, para, de repente, se escancararem em vales matizados com toda a paleta de verdes e castanhos que Deus inventou. E pelas encostas, as quintas vão pintalgando de branco o silêncio majestoso por onde o Rio serpenteia." Francisco Moita Flores

Antonia Adelaide Ferreira Tinto 2016Há quase 160 anos (decorria o dia 12 de Maio de 1861) Dona Antónia, a Ferreirinha, quase perdeu a vida (ironicamente) nas águas do Douro, um rio que tanto adorava e que tanto acarinhou. Saída de barco da Quinta do Vesúvio, uma das suas inúmeras quintas,  na companhia do seu segundo marido, Francisco Torres, e de um grupo de amigos, entre os quais o Barão Forrester (dono da casa de Vinho do Porto Offley), Dona Antónia enfrentou a morte quando a embarcação em que seguia naufragou à passagem pelo então traiçoeiro Cachão da Valeira, no troço onde actualmente se encontra a barragem.

Antonia Adelaide Ferreira Tinto 2016Reza a lenda que Dona Antónia se terá salvo devido ao facto das suas saias rodadas terem formado uma espécie de balão que a manteve a flutuar até que o socorro tivesse chegado. A mesma sorte, já não tiveram, infelizmente, a cozinheira Gertrudes e um criado de Francisco Torres, bem como o Barão de Forrester, que se afundou para nunca mais ser encontrado. Uma versão popular do naufrágio contada pelo Douro diz-nos que o Barão talvez não se tivesse salvo devido a um cinto especial com uma grande quantidade de moedas de ouro que transportava sempre consigo.

Antonia Adelaide Ferreira Tinto 2016Para romantizar ainda mais a história, diz-se ainda que ele andava sempre com todo aquele peso em moedas de ouro para impressionar Dona Antónia e quem sabe tornar-se seu marido. Durante a sua vida Dona Antónia ajudou a acabar com a filoxera, modernizou a produção de vinho, investiu em novas plantações de vinhas em zonas mais expostas ao Sol, criou estoques de vinho do Porto a aproximou o seu Douro do seu país, através do incentivo que deu ao desenvolvimento da ferrovia. 

Antonia Adelaide Ferreira Tinto 2016Investiu ainda, de forma apaixonada e intensa, na sua região, sem esperar pela protecção ou apoio do Estado (será que Dona Antónia votaria Iniciativa Liberal? ;)). Da Ferreirinha diz-se que era generosa com os pobres e mais fracos, mas altiva com os mais ricos e poderosos (será que votaria PCP? ;)); e que estava com a mesma naturalidade tanto em casa dos trabalhadores mais modestos como no Palácio Real (será que votaria Marcelo? ;)). Todo este carinho que deu ao Douro e às suas gentes foi sendo retribuído. Um bom exemplo disso ocorre quando a Ferreirinha morre a 26 de Março 1896. Ao longo dos cerca de quatro quilómetros que o cortejo fúnebre percorreu (entre a Quinta das Nogueiras e a Igreja da Régua), 300 mil durienses (!!!) ladearam a estrada e ajoelharam à passagem dos restos mortais da "santa" e da "mãe dos pobres", como também era conhecida Dona Antónia Adelaide Ferreira, em reconhecimento do ouro mais importante e metaforizado na sua generosidade, integridade, ética e alma abnegada.

Antonia Adelaide Ferreira Tinto 2016Deixou uma fortuna considerável com 35 quintas e foi a maior produtora de vinho da sua época. Mas deixou muito mais que isso... Foi para homenagear todo este legado (não só vínico mas também cultural,  arquitectónico, paisagístico e humano) que a Casa Ferreirinha (pertencente actualmente à Sogrape) criou um vinho de grande qualidade, complexo e elegante, de edição limitada e do qual vos "falo" hoje: o AAF Antónia Adelaide Ferreira Tinto, neste caso a colheita de 2016. 

Antonia Adelaide Ferreira Tinto 2016Dona Antónia Adelide Ferreita Tinto 2016 (75.00 €, 95 pts.) é um vinho enorme!!! É vinificado na Adega da Quinta da Leda, com tecnologia apurada, a partir de lotes de uvas provenientes das quintas da Leda, Seixo, Caêdo, Sairrão e Porto. As uvas são vinificadas por castas ou em lotes escolhidos na vinha. 

Antonia Adelaide Ferreira Tinto 2016Depois, realiza a fermentação maloláctica em barricas de carvalho francês. Segue-se a maturação, durante cerca de 24 meses, em tonéis de carvalho francês. O lote final é elaborado com base na selecção dos melhores vinhos, resultantes das inúmeras provas e análises efectuadas durante esse período. 

Antonia Adelaide Ferreira Tinto 2016De cor rubi-granada densa e bonita, tem um nariz muito intenso e com muitas dimensões, é complexo e harmonioso com ameixa vermelha fresca, frutos silvestres, pimenta preta, urze, resina e uns balsâmicos deliciosos (são estes balsâmicos belíssimos aliados às notas arbustivas e a alguma pedregosidade, que na minha opinião ajudam a definir a alma dos vinhos de topo de Luís Sottomayor). No palato é untuoso e exibe um excelente equilíbrio entre volume, textura, acidez e secura. É um vinho que não acaba. ;) Acompanhou de forma magistral umas Presas de porco preto

Antonia Adelaide Ferreira Tinto 2016O prazer de beber um vinho destes não está relacionado apenas com a "conversa" bonita que  podemos ter com um dos grandes do Douro (este 2016 é das edições mais bem conseguidas) e apercebermo-nos de toda a complexidade e notas equilibradas que carrega.  É também o de prestar uma justa homenagem (nem que seja apenas a recordarmos histórias como as que vos contei hoje) a uma mulher, a um mito, a um legado, que se tornou um símbolo não só do empreendedorismo e da viticultura duriense, mas também um exemplo maior do altruísmo, da "porreirice" e da generosidade para com os mais necessitados.

10.jpgSou daqueles que não acredita em coincidências e que a bondade (ou a falta dela) com que vivemos influencia episódios determinantes da nossa história/vida. Naquela noite de tempestade de 12 de Maio de 1861, houve um ouro que poderá ter puxado para baixo, mas houve outro tipo de ouro, bem mais valioso, que com certeza, ajudou a puxar a Ferrerinha para cima. ;)

 

Presas de porco preto:

-Grelhem em azeite, alho e loureiro os pedaços de presa de porco ibérico. Depois de estarem bem tostados de ambos os lados acrescentem brandy, vinho do Porto Rubi, um pouco de sumo de limão e uma rodelas de chouriça de porco preto e deixem cozinhar lentamente por 30 minutos até o molho reduzir bastante;  

-Acompanhem com um puré de grão e uns legumes salteados com pimenta e noz-moscada.