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No meu Palato

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Barão do Hospital | Uma Ordem por decifrar

"Os bons e os maus resultados dos nossos ditos e obras vão-se distribuindo, supõe-se que de uma maneira bastante uniforme e equilibrada, por todos os dias do futuro, incluindo aqueles, infindáveis, em que já cá não estaremos para poder comprová-lo, para congratularmo-nos ou para pedir perdão, aliás, há quem diga que é isto a imortalidade de que tanto se fala." José Saramago

Barão do HospitalJá vos contei que os Cavaleiros Hospitalários eram monges que tinham inicialmente como objectivo cuidar dos peregrinos em hospícios na Terra Santa. Mais tarde, esta Ordem do Hospital (também conhecida como Ordem Soberana e Militar Hospitalária de São João de Jerusalém) criada pelo seu primeiro grão-mestre, Gerardo Tum, foi reforçada com alguns Cavaleiros Templários, passando também a ser responsável pela organização das peregrinações aos lugares santos para o cristianismo. Com o surgimento do segundo grão-mestre, Raimundo de Puy, a ordem passa a ser também militar, sem renunciar à sua missão hospitalar.

Barão do HospitalTodos os cavaleiros eram religiosos, sujeitos aos três votos monásticos: de pobreza, de castidade e de obediência. Terão entrado em Portugal, em litígio com Castela, no tempo da condessa Dona Teresa de Leão (a mãe de D. Afonso Henriques e governanta do Condado Portucalense entre 1112-1128). A condessa ter-lhes-á concedido o Mosteiro de Leça do Balio e a Quinta do Hospital com objectivo de proteger os peregrinos que por lá passavam, a caminho de Santiago de Compostela. 

Barão do HospitalHoje em dia a ordem assume o nome de Ordem de Malta (um dia conto-vos a história do porquê desta mudança) e tem um estatuto singular, semelhante ao de um estado, um pouco como acontece com o Vaticano, e curiosamente, também ela está localizada em Roma. Estes Cavaleiros Hospitalários mantiveram uma relação muito estreita com o vinho e com a vinha. Para além de beberem vinho frequentemente (a este facto se atribui a sua elevada longevidade), produzirem vinho e iniciarem o cultivo da vinha nas regiões por onde passavam, o seu legado vínico espalhou sementes por muitos países.

Barão do HospitalSenão vejamos, em Itália a Ordem de Malta possui 14 propriedades vitivinícolas localizadas nas principais regiões italianas; em França foram os responsáveis pelo crescimento e posterior protecção da região de Pomerol  (berço do Petrus); no Chipre os Cavaleiros Hospitalários terão sido os criadores da primeira marca de vinho a nível mundial, o Commandaria (terá sido este vinho que foi considerado por Ricardo I de Inglaterra - o coração de leão, "o vinho dos reis e o rei dos vinhos", frase imortalizada durante o casamento do rei em 1191); mas e em Portugal?

Barão do HospitalCuriosamente em Portugal, é nos terrenos da Quinta do Hospital que vos falei anteriormente, que a Falua produz dois belos vinhos verdes, é sobre ele que vos falo hoje. O Barão do Hospital Loureiro Branco 2020 (8.49 €, 87 pts.) traja uma bonita cor amarela-cítrica e emana notas de tília, flor de limoeiro, limão, lima, maçã verde, assim como uma vincada mineralidade (granito molhado). Na boca é vibrante, intenso e fresco. Gostei sobretudo da parte floral não se sobrepor à fruta.

Barão do HospitalO Barão do Hospital Alvarinho Branco 2020 (14.99 €, 89 pts.), de cor citrina amarela- ligeiramente esverdeada, carrega notas muito elegantes a lichia, damasco, limão, toranja, jasmim , cravinho e a mesma mineralidade que encontrei no Loureiro. Na boca é muito fresco, ligeiramente untuoso e bastante harmonioso. É um vinho que pede comida, e por isso brindei-o com um Risotto de cogumelos, chouriço, açafrão e ervilhas com posta arouquesa e camarão.  

Barão do HospitalAcredito que os solos graníticos com apontamentos de xisto e argila e calhau, abrigado dos ventos frios (o que cria um verdadeiro microclima) e com a presença de oliveiras centenárias, terão pincelado ambos os vinhos com uma intrigante mineralidade, difícil de decifrar, mas que lhe dão uma certa elegância aristocrata, condizente com título nobiliárquico que lhes dá o nome. Sem a Ordem dos Cavaleiros Hospitalários criada em 1048 nada disto teria sido possível, pelo menos com todo este contexto histórico-cultural, há quem diga que é isto a imortalidade de que tanto se fala...