Dona Vitória Garrafeira Tinto 2019 | Um desafio ao tempo
"No Alentejo anda-se quatro ou cinco léguas sem ver uma só alma e há uma enorme quantidade de terra sem cultura. (...) É preciso um dia pensar seriamente nisto." Rainha Dª Maria II
No dia 4 de Setembro de 1913, D. Vitória casou-se com D. Manuel II, o recém deposto Rei de Portugal. Estando o rei exilado em Inglaterra, D. Augusta Vitória nunca recebeu oficialmente o título de rainha. Em homenagem à “última rainha de Portugal” e ao museu de atrelagens da Sociedade Agrícola D.Diniz, nascem no Alentejo vinhos que combinam a genuinidade dos vinhos tipicamente alentejanos, com a modernidade desta que poderia ter sido rainha de Portugal: os vinhos Dona Vitória.
O ano de 2019 permitiu engradecer a homenagem, assentindo o aparecimento da mais recente referência Dona Vitória: o topo de gama Dona Vitória Garrafeira. Com uvas de grande qualidade e resultante da junção sábia de Alicante Bouschet, Syrah e Touriga Nacional, este é um vinho que, como o próprio nome indica, aponta para a guarda e para momentos especiais que serão saudados em casa.
As uvas são colhidas manualmente e mecanicamente, seguindo para um tapete de escolha de cachos manual. Neste blend de Syrah, Alicante Bouschet, e Touriga Nacional, a vinificação do Syrah foi feita em lagares abertos com pisa automática e com trabalho de extração muito controlado enquanto que o Alicante Bouschet é a única que fermenta em cuba de inox fechada a 25°, procurando a concentração e a fruta.
A menção "Garrafeira", uma designação usada para os vinhos que o tempo – para além dos enólogos – ajuda a esculpir, é utilizada em vinhos especiais e de qualidade excepcional. Sendo a mais controlada, obriga também a um estágio de envelhecimento por um período mínimo de 30 meses (dos quais 12 em garrafa).
Assim, este vinho envelheceu em pequenas barricas de carvalho francês durante 18 meses, e após engarrafamento, em garrafas deitadas numa cave fresca durante 12 meses. Tudo isto originou um vinho com elevado potencial de guarda. Foram lançadas no mercado apenas 3 332 garrafas. O Dona Vitória Garrafeira Tinto 2019 (20.00 €, 90 pts.) traja um belo rubi denso e cristalino, quase real (:P), e brinda-nos com aromas a frutos do bosque, compota de amora, pimento vermelho, cacau, café, azeitona e baunilha. Na boca é encorpado, ligeiramente austero, seco, fresco, longo e equilibrado.
Outra rainha, a rainha Dona Maria II proferiu em 1843 a frase com que emoldurei esta publicação. Se hoje nos fizesse uma visita, provavelmente, continuaria a verificar esta bipolaridade lusitana quase crónica; a de um país a duas velocidades, a quase vertiginosa das grandes cidades sobrelotadas, e a esquecidamente vagarosa do interior despovoado. No entanto, também constataria, com alegria, que no seu Alentejo (que era urgente pensar), já se fazerem vinhos como este, que parecem querer desafiar o tempo.