Maison Albar Amoure | A eternidade de Sofia pintada pela Bia
“No Minho, a terra canta e o verde é uma promessa de eternidade.” Sophia de Mello Breyner Andresen
A eternidade, esse conceito tão vasto quanto inatingível, raras vezes se deixa tocar. Em geral, associámo-la aos deuses, à física ou às estrelas que parecem imóveis no céu. Mas Sophia ousou localizá-la aqui, entre nós, na terra que canta e se cobre de verde. Essa escolha não é inocente: ao afirmar que o verde é uma promessa de eternidade, a poeta reconduz-nos da metafísica para o chão, da abstracção para a vida sensível. A eternidade deixa de ser uma ideia intocável e passa a ser um rumor que sobe pelas raízes das árvores, um sopro húmido que corre nas folhas.
Dizer que a terra canta é atribuir-lhe uma voz. E se a terra tem voz, talvez tenha também memória. Uma memória que não se mede em décadas ou séculos, mas em ciclos e estações. O que Sophia intui é que há uma eternidade menor, feita não de duração absoluta, mas de repetição. O verde regressa sempre, ou quase sempre, e nessa fidelidade silenciosa talvez se esconda a promessa de algo que perdura. Não uma eternidade estática, mas uma eternidade circular.
A paisagem do Minho, tal como a pintura de um mestre, repete-se e transforma-se. Não há dois outonos iguais, mas todos têm em si algo que os torna reconhecíveis. Esta é a sabedoria da natureza: mudar o suficiente para ser nova, mas não tanto que se perca. Voltaremos a este pensamento mais tarde ;) Ao contrário do homem, que se inquieta com o efémero, o campo aceita a transitoriedade como parte da sua respiração. Talvez por isso a eternidade seja verde, porque é no vegetal que a passagem do tempo se dissolve.
A filosofia antiga já vislumbrava essa dimensão. Heraclito falava do devir, do rio que corre e nunca é o mesmo. Mas também há em Píndaro ou em Empédocles a noção de que a natureza contém em si uma ordem que se renova. Sophia, ao colocar a sua promessa na terra que canta, alinha-se com essa tradição que vê no mundo natural um espelho do eterno. Não do eterno imutável, mas do eterno que se dá a ver no quotidiano.
Curiosamente, também Van Gogh, embora com outro léxico e outra angústia, procurava essa eternidade. A sua “Noite Estrelada” não é uma paisagem realista: é uma visão. O céu que ali se agita, cheio de vórtices e espirais, é a tentativa de captar um movimento que está para além do visível. Como Sophia, Van Gogh sabia que o mundo sensível esconde algo mais. No seu caso, essa busca era marcada pela dor ... mas também pela luz.
As estrelas de Van Gogh não são pontos fixos; são redemoinhos de energia. Representam talvez a ideia de que a eternidade não é um repouso, mas uma vibração constante. O céu não é um tecto, mas um campo vivo. Como se a noite tivesse uma pulsação. A pintura sugere que mesmo o escuro é habitado, mesmo o silêncio tem voz, como a terra de Sophia.
A eternidade, então, não está na ausência de mudança, mas na persistência de um ritmo. Van Gogh tenta fixar esse ritmo com tinta. Sophia com palavras. Ambos, no fundo, são intérpretes do mesmo cântico que emana da terra e do céu. Aquilo que chamamos “arte” é, talvez, essa tentativa humana de fazer ressoar a eternidade no tempo breve da nossa existência.
Mas há diferenças importantes. A poesia de Sophia parte da serenidade; a pintura de Van Gogh, do tumulto. Ambos falam de estrelas, mas em tons diferentes. Para Sophia, o verde é um sinal de ordem e fecundidade. Para Van Gogh, as estrelas são olhos que nos observam, inquietantes, quase sagrados. Duas formas de eternidade: uma que conforta, outra que perturba.
E ainda assim, há um ponto onde se tocam. É no reconhecimento de que o mundo natural não é apenas cenário, mas protagonista. Sophia ouve a terra cantar. Van Gogh vê o céu vibrar. Ambos recusam a ideia de que o real é mudo. E se o mundo tem voz, então merece ser escutado, não apenas descrito ou usado.
Essa escuta é rara. Vivemos rodeados de ruído e pressa, e só quando abrandamos é que percebemos que o tempo pode ter outra textura. Uma textura feita de vento nas folhas, de sombra sobre a relva, de silêncio que não pesa. É nesses momentos que a eternidade se insinua, não como uma ideia, mas como uma presença discreta.
O desafio, claro, é saber ver e saber ouvir. A eternidade não se impõe; revela-se. Está no brilho de uma folha ao sol, no canto de um pássaro invisível, num céu que parece querer dizer qualquer coisa sem palavras. Van Gogh tentou captá-la com pinceladas rápidas, quase febris. Sophia com versos claros, quase oraculares. O leitor e o espectador precisam de estar disponíveis para esse encontro.
Talvez a infância nos ajude a aproximar-nos dessa disponibilidade. As crianças, ainda livres do peso do tempo, olham o mundo como se tudo estivesse a acontecer pela primeira vez. Para elas, o céu não é cenário, é mistério. Não precisam de saber o nome das estrelas para se deixarem tocar por elas. Talvez Sophia e Van Gogh tenham conservado algo dessa infância espiritual.
Não é por acaso que a eternidade é promessa, e não certeza. A promessa implica fé, abertura, espera. É algo que nos é dado, mas também algo que temos de escolher receber. O verde do Minho pode muito bem ser só verde. Mas para quem escuta, pode ser voz. Para quem vê, pode ser sinal. Como a noite estrelada de Van Gogh.
Assim, a arte e a natureza tornam-se aliadas na luta contra a dissolução. Contra a sensação de que tudo é fugaz, descartável, irrelevante. Sophia escreve contra o esquecimento. Van Gogh pinta contra a morte. Ambos nos dizem: olha, escuta: aqui há algo que resiste ao tempo. Mesmo que não saibas dar-lhe nome.
E é talvez esse o papel mais alto da experiência estética: ensinar-nos a esperar. A aceitar que há coisas que não se medem nem se consomem. Que o mundo, se for bem olhado, canta. E que o verde, ao repetir-se, nos sussurra que talvez, apenas talvez, haja uma eternidade possível, mesmo que só por instantes.
Há lugares onde o tempo parece respirar devagar, em sincronia com o corpo e a memória. O Maison Albar Amoure é um desses espaços, mesmo que não o saibamos ao chegar. O primeiro impacto é de surpresa silenciosa: uma arquitectura que se oculta na paisagem em vez de a dominar, interiores que combinam sobriedade com detalhe, uma luz natural que parece cuidadosamente escolhida. Aqui, a elegância é feita de contenção, e o luxo manifesta-se sobretudo na forma como se respeita o silêncio. Cada corredor, cada recanto do jardim, parece ter sido desenhado para escutar a música subterrânea da terra.
A recepção é cordial, discreta e eficiente, é acompanhada de Champagne, como um gesto que não se impõe, mas acolhe. Assim, desde o primeiro contacto, sente-se que o verdadeiro luxo do lugar está nas pequenas coisas: as palavras certas no tom certo ao receber, a ausência de pressa nos gestos, a tranquilidade com que somos guiados até ao quarto. O espaço convida ao repouso, mas também à contemplação. E nesse equilíbrio entre o íntimo e o expansivo, entre o individual e o natural, começa a desenhar-se a promessa de uma experiência rara. Um lugar onde o tempo não desaparece, mas se desdobra.
O restaurante L'Amoure é talvez a expressão mais visível dessa filosofia. Dirigido pelo chef estrelado Julien Montbabut, propõe uma cozinha que se recusa a gritar, mas também não sussurra. É uma voz firme, confiante, profundamente enraizada na tradição local, mas com olhos postos na inovação. Os Croquetes de alheira de aves com maionese de trufa são uma abertura que não procura apenas conforto, mas também provocação subtil. A trufa não é usada como artifício, mas como acento, como sublinhado final de uma frase bem construída. A estrutura delicada do Mil folhas de batata, ovas de truta e crème fraîche surpreende pela leveza: cada camada é fina, crocante e untuosa, sem se tornar pesada. As ovas de truta explodem ao toque, oferecendo salinidade e textura, enquanto a crème fraîche amacia o conjunto com uma acidez subtil. Um prato que brinca com contrastes, entre quente e frio, crocante e cremoso, e revela um domínio técnico refinado sobre ingredientes simples. A entrada ideal para abrir o apetite com precisão e elegância.
Segue-se Escabeche de cavala, pimento piquillo e azeite de coentros. A cavala, curada e delicadamente escabechada, revela frescura e acidez controlada, sem anular o carácter do peixe. O pimento piquillo, doce e macio, aporta profundidade e uma nota fumada que eleva o conjunto. O azeite de coentros surge como assinatura vegetal e aromática, trazendo frescura e identidade atlântica. Um prato que honra a tradição ibérica com precisão técnica e bom gosto, onde tudo se equilibra num registo leve e sofisticado. O Ovo panado e frito, cogumelos e salsa chega com gema líquida e envolto numa camada fina e dourada, crocante sem ser pesada. Os cogumelos, salteados com simplicidade e sabor, trazem notas terrosas que ancoram o prato. A salsa, fresca e aromática, acrescenta um toque herbal que eleva o conjunto. Um clássico bem executado, que aposta no contraste entre texturas e na intensidade natural dos ingredientes.
Mas talvez o momento mais alto do percurso inicial salgado tenha sido o Tártaro de carne minhota e tosta brioche. A carne minhota, cortada na faca e temperada com equilíbrio, revela textura firme e sabor autêntico. A tosta de brioche, ligeiramente adocicada e amanteigada, oferece contraste e suporte, sem dominar. Há um respeito claro pelo produto, sem excessos nem artifícios. Um tártaro sóbrio, directo, em que a qualidade da carne e a afinação do tempero falam mais alto. A textura sequencial das camadas, a untuosidade da carne, a tenacidade da mostarda, tudo ali remete para uma arte de compor e decompor. A cozinha do chef Julien é isso mesmo, uma espécie de caligrafia do sabor. Um gesto controlado, mas nunca frio.
A Posta de bacalhau meia cura, esmagado de batata, velouté de mexilhão, apresenta-se generosa, no ponto ideal entre firmeza e suculência. A cura parcial intensifica-lhe o sabor sem o endurecer, permitindo ao velouté de mexilhão envolver tudo com untuosidade e salinidade contida. O esmagado de batata cumpre bem o papel de suporte, textural e discreto, deixando o protagonismo ao peixe. Um prato bem estruturado, onde o mar é evocado com sobriedade e sentido de equilíbrio. A Presa de porco ibérico, legumes da horta, molho chimichurri chega no ponto certo, rosada e suculenta, com a gordura fundida a intensificar cada garfada. Os legumes da horta, salteados com precisão, mantêm a cor, a textura e o sabor original, sem se perderem em adornos desnecessários. O molho chimichurri acrescenta frescura, acidez e um leve toque picante, a cortar a untuosidade da carne e a unir todos os elementos do prato. Um equilíbrio feliz entre rusticidade e elegância, com sabor e substância.
As sobremesas mantêm o nível. A Maçã caramelizada, streusel e baunilha, cozinhada no ponto certo, preserva a sua textura mas ganha profundidade com o caramelo ligeiramente amargo. O streusel traz crocância e uma nota amanteigada que liga bem com a doçura da fruta. A baunilha, discreta mas presente, une todos os elementos com suavidade e calor. Uma sobremesa reconfortante, que joga na simplicidade e acerta no prazer. A Mousse de chocolatre com praliné e avelãs tostadas tem a intensidade certa, equilibrada pelo praliné crocante e pelas avelãs tostadas que acrescentam textura e um final ligeiramente fumado. Uma sobremesa bem pensada, que pincela a refeição com conforto e sabor. A Tarte de Mirtilo com amêndoa e chantilly oferece um fecho mais contido, mas igualmente cuidado e cheio de sabor. A doçaria aqui não pretende encantar pela opulência, mas pela justeza de cada elemento. A carta de vinhos, bem equilibrada e com boa representação nacional,.
O pequeno-almoço do dia seguinte é uma extensão do mesmo princípio: qualidade sem ostentação. Pode servido na varanda do quarto ou numa sala com uma elegância aristocrata. Os sumos são naturais, os iogurtes caseiros, o pão fresco e variado. Há compotas de fruta da estação, queijos e enchidos de origem controlada, e uma selecção de bolos que resistem à pressa. Para os gulosos como eu há ainda ovos Amoure ou tostas de abacate acompanhados por um belo Champagne. Tudo é apresentado com leveza e delicadeza, como se a primeira refeição do dia fosse também uma forma de agradecimento à noite que passou.
O Spa é um capítulo à parte. Piscina interior de linhas puras, sauna de madeira clara, banho turco e salas de massagem onde o tempo se dobra sobre si mesmo. O corpo ali desaprende a urgência, e reencontra a escuta. As terapeutas não seguem um guião, mas lêem o corpo como um texto vivo. O silêncio, aqui, não é vazio: é matéria terapêutica. E a água, que tudo embala, parece devolver ao corpo o que o cansaço da vida urbana lhe rouba.
No exterior, a piscina rodeada de vinhas, limoeiros e oliveiras retoma o tema da eternidade vegetal. A paisagem aqui não é apenas vista: é horizonte habitado. As espreguiçadeiras, dispostas com inteligência e generosidade, permitem privacidade sem isolamento. A luz da tarde cria sombras móveis, e o som das folhas substitui qualquer música ambiente. Nas horas de sol é servida água fresca e pequenos mimos gastronómicos. É um lugar para estar. Não para ver, não para mostrar. Apenas para ser.
Foi nesse espaço de suspensão que a Bia, sem saber, desenhou o céu. Estávamos no alpendre, antes do jantar, e como muitas vezes faz, pediu lápis e folhas para desenhar. Em silêncio, começou a traçar, desta vez e estranhamente só a preto, cruzes escuras num papel branco. Mostrou-mo depois, como quem oferece algo sem saber bem o quê. Era um céu nocturno, não idêntico ao de Van Gogh, mas irmão. Se Sophia pintasse a "Noite Estrelada", não andaria longe disto. Reparem no nome que a Bia deu ao desenho e digam-me se não temos ali uma artista. :P E naquele gesto simples, senti que tudo o que havíamos vivido ali se condensava numa folha.
Sem conhecer o quadro, a Bia captou o mesmo movimento: estrelas que não estão quietas, mas dançam. Céu que pulsa, que se agita, que observa. Como se o universo fosse mais próximo do que pensamos, e o olhar de uma criança bastasse para o trazer até nós. Tudo isto com a melancolia de Sophia. Foi então que percebi que aquele lugar, com o seu silêncio, o seu verde, o seu ritmo, não era apenas uma fuga. Era uma espécie de reencontro com a eternidade de Sophia e com a luz de Van Gogh.
A promessa de eternidade de que fala Sophia não é uma miragem. É uma prática. Um modo de estar. Uma escolha por tudo o que se faz devagar, com presença, com cuidado. É o que senti naquele hotel, naquele restaurante, naquele bar, curiosamente trajados de verde. Não porque me disseram. Mas porque tudo ali parecia construído para durar, ou então para fazer com que o tempo se tornasse habitável.
Há hotéis que se medem em estrelas. Outros, em silêncios. Outros ainda, em traços de lápis. O Maison Albar Amoure ficará na minha memória como um lugar onde se pode ouvir a terra a cantar. Onde o verde não é apenas cor, mas linguagem. Onde o céu é, finalmente, mais do que cenário. É companheiro.
Esta não é uma crítica, no sentido habitual da palavra. É antes uma carta escrita a partir de um lugar raro. Um lugar onde aprendi que a eternidade pode ter cheiro de pão fresco, sabor de mille-feuille de batata e textura de toalha aquecida. Um lugar onde a infância da minha filha encontrou eco num quadro que nunca viu. Onde a arte, a natureza e a hospitalidade se tocaram por instantes.
Ao longo da estadia, percebi que a beleza aqui não é um fim. É um meio. Um meio para chegar a esse estado raro de presença total, onde tudo faz sentido. Onde o prato não é apenas comida, mas narrativa. Onde o gesto do empregado não é rotina, mas ritual. Onde a paisagem não é fundo, mas personagem.
Poderia falar de preços, de promoções, de localização. Mas tudo isso seria empobrecer o essencial. O que aqui se oferece não é apenas alojamento ou refeição. É uma forma de respirar. De estar no mundo com mais lentidão e mais graça. E isso, mais do que estrelas ou distinções, é o que torna este lugar notável.
No regresso, trouxe pouco. Um postal. Um guardanapo rabiscado. Uma frase da Bia: “o céu estava a andar”. E a sensação de que, por uns dias, vivi num tempo paralelo. Um tempo que não corre, mas flui. Que não se mede em horas, mas em instantes partilhados.
Escrevo agora, meses depois, 10 000 km de distância e ainda ouço o som das folhas, o tilintar discreto de talheres, a água a correr no spa. E mais do que tudo, recordo o desenho da Bia. Porque nesse gesto está contida toda a crítica. Tudo o que importa dizer.
"No Minho, a terra canta e o verde é uma promessa de eternidade.” E naquele hotel, essa frase foi mais do que verso. Foi chão, foi tecto, foi alimento. Foi vivida. Foi confirmada.
E como Van Gogh, também eu queria fixar num papel aquilo que se move dentro de mim. Mas as palavras falham, e talvez o melhor que se possa fazer seja agradecer. A quem constrói lugares assim. A quem resiste à pressa.
O Maison Albar Amoure não precisa de publicidade. Precisa de tempo. De leitores atentos. De hóspedes dispostos a escutar. E talvez, também eles, saiam de lá com um desenho no bolso e um céu em movimento dentro do peito. Para quem ainda acredita que viajar é mais do que consumir paisagens, este é um destino. Um lugar onde o que se sente vale mais do que o que se vê. Onde o silêncio é linguagem. E o detalhe, uma forma de amor.
Voltando ao pensamento de há uns parágrafos atrás, a crítica gastronómica já foi feita. Mas o que permanece não são os pratos, é a memória do cuidado. Da intenção. Da escuta. A escuta da terra, das estações, dos ingredientes, das pessoas. A mesma que encontramos na paisagem do Minho, que, como a pintura de um mestre, se repete e transforma. Também aqui, na cozinha do Maison Albar Amoure, há mudança suficiente para ser nova, mas não tanta que se perca.
O Chef Julien Montbabut, detentor de estrela no Maison Albar Monumental Palace, trouxe consigo essa sabedoria. E fá-lo em cumplicidade com o Chef Executivo Adjunto Marco Silva, cuja sensibilidade e rigor ajudam a dar corpo a esta nova morada gastronómica. A de quem sabe que inovação não é ruptura, mas continuidade atenta. Neste restaurante recém-nascido, o gesto é firme: a tradição está lá, nos sabores, nas texturas, na alma dos pratos, mas há também estética, leveza, uma elegância que não grita.
Como o campo, que aceita a transitoriedade com naturalidade, também esta mesa sabe que a excelência não está no excesso, mas no ritmo certo. Por isso a experiência ressoa: porque é feita de sabor, mas também de permanência. E talvez por isso. só talvez, a eternidade, por breves instantes, tenha ali voltado a ser verde.
O que permanece é a possibilidade de eternidade que se abriu entre uma folha de batata e um fio de trufa. Entre um céu desenhado e uma promessa escrita num verso. Porque sim, no Minho, a terra canta. E o verde, o verde é mesmo uma promessa de eternidade.
Escrevo-vos estas linhas com o coração pousado no Minho, mas os pés agora cravados nas areias vulcânicas das Galápagos, onde estou em trabalho. Aqui o mar tem outra voz e os pássaros outro nome. Daqui, entre vulcões adormecidos, leões marinhos brincalhões, tartarugas pensativas e iguanas curiosas, envio um abraço e um beijo para quem teve a paciência de ler todo este texto. Que o vosso verde, onde quer que estejam, também cante. E que a promessa da eternidade, mesmo que breve, vos surpreenda num prato, num céu ou num sorriso.