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No meu Palato

No meu Palato

Maison Albar Amoure | A eternidade de Sofia pintada pela Bia

“No Minho, a terra canta e o verde é uma promessa de eternidade.” Sophia de Mello Breyner Andresen

Maison Albar AmoureA eternidade, esse conceito tão vasto quanto inatingível, raras vezes se deixa tocar. Em geral, associámo-la aos deuses, à física ou às estrelas que parecem imóveis no céu. Mas Sophia ousou localizá-la aqui, entre nós, na terra que canta e se cobre de verde. Essa escolha não é inocente: ao afirmar que o verde é uma promessa de eternidade, a poeta reconduz-nos da metafísica para o chão, da abstracção para a vida sensível. A eternidade deixa de ser uma ideia intocável e passa a ser um rumor que sobe pelas raízes das árvores, um sopro húmido que corre nas folhas.

Maison Albar AmoureDizer que a terra canta é atribuir-lhe uma voz. E se a terra tem voz, talvez tenha também memória. Uma memória que não se mede em décadas ou séculos, mas em ciclos e estações. O que Sophia intui é que há uma eternidade menor, feita não de duração absoluta, mas de repetição. O verde regressa sempre, ou quase sempre, e nessa fidelidade silenciosa talvez se esconda a promessa de algo que perdura. Não uma eternidade estática, mas uma eternidade circular.

Maison Albar AmoureA paisagem do Minho, tal como a pintura de um mestre, repete-se e transforma-se. Não há dois outonos iguais, mas todos têm em si algo que os torna reconhecíveis. Esta é a sabedoria da natureza: mudar o suficiente para ser nova, mas não tanto que se perca. Voltaremos a este pensamento mais tarde ;) Ao contrário do homem, que se inquieta com o efémero, o campo aceita a transitoriedade como parte da sua respiração. Talvez por isso a eternidade seja verde, porque é no vegetal que a passagem do tempo se dissolve.

Maison Albar AmoureA filosofia antiga já vislumbrava essa dimensão. Heraclito falava do devir, do rio que corre e nunca é o mesmo. Mas também há em Píndaro ou em Empédocles a noção de que a natureza contém em si uma ordem que se renova. Sophia, ao colocar a sua promessa na terra que canta, alinha-se com essa tradição que vê no mundo natural um espelho do eterno. Não do eterno imutável, mas do eterno que se dá a ver no quotidiano.

Maison Albar AmoureCuriosamente, também Van Gogh, embora com outro léxico e outra angústia, procurava essa eternidade. A sua “Noite Estrelada” não é uma paisagem realista: é uma visão. O céu que ali se agita, cheio de vórtices e espirais, é a tentativa de captar um movimento que está para além do visível. Como Sophia, Van Gogh sabia que o mundo sensível esconde algo mais. No seu caso, essa busca era marcada pela dor ... mas também pela luz.

Maison Albar AmoureAs estrelas de Van Gogh não são pontos fixos; são redemoinhos de energia. Representam talvez a ideia de que a eternidade não é um repouso, mas uma vibração constante. O céu não é um tecto, mas um campo vivo. Como se a noite tivesse uma pulsação. A pintura sugere que mesmo o escuro é habitado, mesmo o silêncio tem voz,  como a terra de Sophia.

Maison Albar AmoureA eternidade, então, não está na ausência de mudança, mas na persistência de um ritmo. Van Gogh tenta fixar esse ritmo com tinta. Sophia com palavras. Ambos, no fundo, são intérpretes do mesmo cântico que emana da terra e do céu. Aquilo que chamamos “arte” é, talvez, essa tentativa humana de fazer ressoar a eternidade no tempo breve da nossa existência.

Maison Albar AmoureMas há diferenças importantes. A poesia de Sophia parte da serenidade; a pintura de Van Gogh, do tumulto. Ambos falam de estrelas, mas em tons diferentes. Para Sophia, o verde é um sinal de ordem e fecundidade. Para Van Gogh, as estrelas são olhos que nos observam, inquietantes, quase sagrados. Duas formas de eternidade: uma que conforta, outra que perturba.

Maison Albar AmoureE ainda assim, há um ponto onde se tocam. É no reconhecimento de que o mundo natural não é apenas cenário, mas protagonista. Sophia ouve a terra cantar. Van Gogh vê o céu vibrar. Ambos recusam a ideia de que o real é mudo. E se o mundo tem voz, então merece ser escutado, não apenas descrito ou usado.

Maison Albar AmoureEssa escuta é rara. Vivemos rodeados de ruído e pressa, e só quando abrandamos é que percebemos que o tempo pode ter outra textura. Uma textura feita de vento nas folhas, de sombra sobre a relva, de silêncio que não pesa. É nesses momentos que a eternidade se insinua, não como uma ideia, mas como uma presença discreta.

Maison Albar AmoureO desafio, claro, é saber ver e saber ouvir. A eternidade não se impõe; revela-se. Está no brilho de uma folha ao sol, no canto de um pássaro invisível, num céu que parece querer dizer qualquer coisa sem palavras. Van Gogh tentou captá-la com pinceladas rápidas, quase febris. Sophia com versos claros, quase oraculares. O leitor e o espectador precisam de estar disponíveis para esse encontro.

12.jpgTalvez a infância nos ajude a aproximar-nos dessa disponibilidade. As crianças, ainda livres do peso do tempo, olham o mundo como se tudo estivesse a acontecer pela primeira vez. Para elas, o céu não é cenário, é mistério. Não precisam de saber o nome das estrelas para se deixarem tocar por elas. Talvez Sophia e Van Gogh tenham conservado algo dessa infância espiritual.

Maison Albar AmoureNão é por acaso que a eternidade é promessa, e não certeza. A promessa implica fé, abertura, espera. É algo que nos é dado, mas também algo que temos de escolher receber. O verde do Minho pode muito bem ser só verde. Mas para quem escuta, pode ser voz. Para quem vê, pode ser sinal. Como a noite estrelada de Van Gogh.

Maison Albar AmoureAssim, a arte e a natureza tornam-se aliadas na luta contra a dissolução. Contra a sensação de que tudo é fugaz, descartável, irrelevante. Sophia escreve contra o esquecimento. Van Gogh pinta contra a morte. Ambos nos dizem: olha, escuta: aqui há algo que resiste ao tempo. Mesmo que não saibas dar-lhe nome.

Maison Albar AmoureE é talvez esse o papel mais alto da experiência estética: ensinar-nos a esperar. A aceitar que há coisas que não se medem nem se consomem. Que o mundo, se for bem olhado, canta. E que o verde, ao repetir-se, nos sussurra que talvez, apenas talvez, haja uma eternidade possível, mesmo que só por instantes.

https://nomeupalato.blogs.sapo.pt/Há lugares onde o tempo parece respirar devagar, em sincronia com o corpo e a memória. O Maison Albar Amoure é um desses espaços, mesmo que não o saibamos ao chegar. O primeiro impacto é de surpresa silenciosa: uma arquitectura que se oculta na paisagem em vez de a dominar, interiores que combinam sobriedade com detalhe, uma luz natural que parece cuidadosamente escolhida. Aqui, a elegância é feita de contenção, e o luxo manifesta-se sobretudo na forma como se respeita o silêncio. Cada corredor, cada recanto do jardim, parece ter sido desenhado para escutar a música subterrânea da terra.

Maison Albar AmoureA recepção é cordial, discreta e eficiente, é acompanhada de Champagne, como um gesto que não se impõe, mas acolhe. Assim, desde o primeiro contacto, sente-se que o verdadeiro luxo do lugar está nas pequenas coisas: as palavras certas no tom certo ao receber, a ausência de pressa nos gestos, a tranquilidade com que somos guiados até ao quarto. O espaço convida ao repouso, mas também à contemplação. E nesse equilíbrio entre o íntimo e o expansivo, entre o individual e o natural, começa a desenhar-se a promessa de uma experiência rara. Um lugar onde o tempo não desaparece, mas se desdobra.

Maison Albar AmoureO restaurante L'Amoure é talvez a expressão mais visível dessa filosofia. Dirigido pelo chef estrelado Julien Montbabut, propõe uma cozinha que se recusa a gritar, mas também não sussurra. É uma voz firme, confiante, profundamente enraizada na tradição local, mas com olhos postos na inovação. Os Croquetes de alheira de aves com maionese de trufa são uma abertura que não procura apenas conforto, mas também provocação subtil. A trufa não é usada como artifício, mas como acento, como sublinhado final de uma frase bem construída. A estrutura delicada do Mil folhas de batata, ovas de truta e crème fraîche surpreende pela leveza: cada camada é fina, crocante e untuosa, sem se tornar pesada. As ovas de truta explodem ao toque, oferecendo salinidade e textura, enquanto a crème fraîche amacia o conjunto com uma acidez subtil. Um prato que brinca com contrastes, entre quente e frio, crocante e cremoso, e revela um domínio técnico refinado sobre ingredientes simples. A entrada ideal para abrir o apetite com precisão e elegância.

Maison Albar AmoureSegue-se Escabeche de cavala, pimento piquillo e azeite de coentros. A cavala, curada e delicadamente escabechada, revela frescura e acidez controlada, sem anular o carácter do peixe. O pimento piquillo, doce e macio, aporta profundidade e uma nota fumada que eleva o conjunto. O azeite de coentros surge como assinatura vegetal e aromática, trazendo frescura e identidade atlântica. Um prato que honra a tradição ibérica com precisão técnica e bom gosto, onde tudo se equilibra num registo leve e sofisticado. O Ovo panado e frito, cogumelos e salsa  chega com gema líquida e envolto numa camada fina e dourada, crocante sem ser pesada. Os cogumelos, salteados com simplicidade e sabor, trazem notas terrosas que ancoram o prato. A salsa, fresca e aromática, acrescenta um toque herbal que eleva o conjunto. Um clássico bem executado, que aposta no contraste entre texturas e na intensidade natural dos ingredientes.

Maison Albar AmoureMas talvez o momento mais alto do percurso inicial salgado tenha sido o Tártaro de carne minhota e tosta brioche. A carne minhota, cortada na faca e temperada com equilíbrio, revela textura firme e sabor autêntico. A tosta de brioche, ligeiramente adocicada e amanteigada, oferece contraste e suporte, sem dominar. Há um respeito claro pelo produto, sem excessos nem artifícios. Um tártaro sóbrio, directo, em que a qualidade da carne e a afinação do tempero falam mais alto. A textura sequencial das camadas, a untuosidade da carne, a tenacidade da mostarda, tudo ali remete para uma arte de compor e decompor. A cozinha do chef Julien é isso mesmo, uma espécie de caligrafia do sabor. Um gesto controlado, mas nunca frio.

Maison Albar AmoureA Posta de bacalhau meia cura, esmagado de batata, velouté de mexilhão, apresenta-se generosa, no ponto ideal entre firmeza e suculência. A cura parcial intensifica-lhe o sabor sem o endurecer, permitindo ao velouté de mexilhão envolver tudo com untuosidade e salinidade contida. O esmagado de batata cumpre bem o papel de suporte, textural e discreto, deixando o protagonismo ao peixe. Um prato bem estruturado, onde o mar é evocado com sobriedade e sentido de equilíbrio. A Presa de porco ibérico, legumes da horta, molho chimichurri chega no ponto certo, rosada e suculenta, com a gordura fundida a intensificar cada garfada. Os legumes da horta, salteados com precisão, mantêm a cor, a textura e o sabor original, sem se perderem em adornos desnecessários. O molho chimichurri acrescenta frescura, acidez e um leve toque picante, a cortar a untuosidade da carne e a unir todos os elementos do prato. Um equilíbrio feliz entre rusticidade e elegância, com sabor e substância.

Maison Albar AmoureAs sobremesas mantêm o nível. A Maçã caramelizada, streusel e baunilha, cozinhada no ponto certo, preserva a sua textura mas ganha profundidade com o caramelo ligeiramente amargo. O streusel traz crocância e uma nota amanteigada que liga bem com a doçura da fruta. A baunilha, discreta mas presente, une todos os elementos com suavidade e calor. Uma sobremesa reconfortante, que joga na simplicidade e acerta no prazer. A Mousse de chocolatre com praliné e avelãs tostadas  tem a intensidade certa, equilibrada pelo praliné crocante e pelas avelãs tostadas que acrescentam textura e um final ligeiramente fumado. Uma sobremesa bem pensada, que pincela a refeição com conforto e sabor. A Tarte de Mirtilo com amêndoa e chantilly oferece um fecho mais contido, mas igualmente cuidado e cheio de sabor. A doçaria aqui não pretende encantar pela opulência, mas pela justeza de cada elemento. A carta de vinhos, bem equilibrada e com boa representação nacional,.

Maison Albar AmoureO pequeno-almoço do dia seguinte é uma extensão do mesmo princípio: qualidade sem ostentação. Pode servido na varanda do quarto ou numa sala com uma elegância aristocrata. Os sumos são naturais, os iogurtes caseiros, o pão fresco e variado. Há compotas de fruta da estação, queijos e enchidos de origem controlada, e uma selecção de bolos que resistem à pressa. Para os gulosos como eu há ainda ovos Amoure ou tostas de abacate acompanhados por um belo Champagne. Tudo é apresentado com leveza e delicadeza, como se a primeira refeição do dia fosse também uma forma de agradecimento à noite que passou. 

Maison Albar AmoureO Spa é um capítulo à parte. Piscina interior de linhas puras, sauna de madeira clara, banho turco e salas de massagem onde o tempo se dobra sobre si mesmo. O corpo ali desaprende a urgência, e reencontra a escuta. As terapeutas não seguem um guião, mas lêem o corpo como um texto vivo. O silêncio, aqui, não é vazio: é matéria terapêutica. E a água, que tudo embala, parece devolver ao corpo o que o cansaço da vida urbana lhe rouba.

Maison Albar Amoure

No exterior, a piscina rodeada de vinhas, limoeiros e oliveiras retoma o tema da eternidade vegetal. A paisagem aqui não é apenas vista: é horizonte habitado. As espreguiçadeiras, dispostas com inteligência e generosidade, permitem privacidade sem isolamento. A luz da tarde cria sombras móveis, e o som das folhas substitui qualquer música ambiente. Nas horas de sol é servida água fresca e pequenos mimos gastronómicos. É um lugar para estar. Não para ver, não para mostrar. Apenas para ser.

Maison Albar AmoureFoi nesse espaço de suspensão que a Bia, sem saber, desenhou o céu. Estávamos no alpendre, antes do jantar, e como muitas vezes faz, pediu lápis e folhas para desenhar. Em silêncio, começou a traçar, desta vez e estranhamente só a preto,  cruzes escuras num papel branco. Mostrou-mo depois, como quem oferece algo sem saber bem o quê. Era um céu nocturno, não idêntico ao de Van Gogh, mas irmão. Se Sophia pintasse a "Noite Estrelada", não andaria longe disto.  Reparem no nome que a Bia  deu ao desenho e digam-me se não temos ali uma artista. :P E naquele gesto simples, senti que tudo o que havíamos vivido ali se condensava numa folha.

Maison Albar AmoureSem conhecer o quadro, a Bia captou o mesmo movimento: estrelas que não estão quietas, mas dançam. Céu que pulsa, que se agita, que observa. Como se o universo fosse mais próximo do que pensamos, e o olhar de uma criança bastasse para o trazer até nós. Tudo isto com a melancolia de Sophia. Foi então que percebi que aquele lugar, com o seu silêncio, o seu verde, o seu ritmo, não era apenas uma fuga. Era uma espécie de reencontro com a eternidade de Sophia e com a luz de Van Gogh.

Maison Albar AmoureA promessa de eternidade de que fala Sophia não é uma miragem. É uma prática. Um modo de estar. Uma escolha por tudo o que se faz devagar, com presença, com cuidado. É o que senti naquele hotel, naquele restaurante, naquele bar, curiosamente trajados de verde. Não porque me disseram. Mas porque tudo ali parecia construído para durar, ou então para fazer com que o tempo se tornasse habitável.

Maison Albar Amoure

Há hotéis que se medem em estrelas. Outros, em silêncios. Outros ainda, em traços de lápis. O Maison Albar Amoure ficará na minha memória como um lugar onde se pode ouvir a terra a cantar. Onde o verde não é apenas cor, mas linguagem. Onde o céu é, finalmente, mais do que cenário. É companheiro.

Maison Albar AmoureEsta não é uma crítica, no sentido habitual da palavra. É antes uma carta escrita a partir de um lugar raro. Um lugar onde aprendi que a eternidade pode ter cheiro de pão fresco, sabor de mille-feuille de batata e textura de toalha aquecida. Um lugar onde a infância da minha filha encontrou eco num quadro que nunca viu. Onde a arte, a natureza e a hospitalidade se tocaram por instantes.

Maison Albar AmoureAo longo da estadia, percebi que a beleza aqui não é um fim. É um meio. Um meio para chegar a esse estado raro de presença total, onde tudo faz sentido. Onde o prato não é apenas comida, mas narrativa. Onde o gesto do empregado não é rotina, mas ritual. Onde a paisagem não é fundo, mas personagem.

Maison Albar AmourePoderia falar de preços, de promoções, de localização. Mas tudo isso seria empobrecer o essencial. O que aqui se oferece não é apenas alojamento ou refeição. É uma forma de respirar. De estar no mundo com mais lentidão e mais graça. E isso, mais do que estrelas ou distinções, é o que torna este lugar notável.

Maison Albar AmoureNo regresso, trouxe pouco. Um postal. Um guardanapo rabiscado. Uma frase da Bia: “o céu estava a andar”. E a sensação de que, por uns dias, vivi num tempo paralelo. Um tempo que não corre, mas flui. Que não se mede em horas, mas em instantes partilhados.

Maison Albar AmoureEscrevo agora, meses depois, 10 000 km de distância e ainda ouço o som das folhas, o tilintar discreto de talheres, a água a correr no spa. E mais do que tudo, recordo o desenho da Bia. Porque nesse gesto está contida toda a crítica. Tudo o que importa dizer.

Maison Albar Amoure

"No Minho, a terra canta e o verde é uma promessa de eternidade.” E naquele hotel, essa frase foi mais do que verso. Foi chão, foi tecto, foi alimento. Foi vivida. Foi confirmada.

Maison Albar AmoureE como Van Gogh, também eu queria fixar num papel aquilo que se move dentro de mim. Mas as palavras falham, e talvez o melhor que se possa fazer seja agradecer. A quem constrói lugares assim. A quem resiste à pressa.

Maison Albar Amoure

O Maison Albar Amoure não precisa de publicidade. Precisa de tempo. De leitores atentos. De hóspedes dispostos a escutar. E talvez, também eles, saiam de lá com um desenho no bolso e um céu em movimento dentro do peito. Para quem ainda acredita que viajar é mais do que consumir paisagens, este é um destino. Um lugar onde o que se sente vale mais do que o que se vê. Onde o silêncio é linguagem. E o detalhe, uma forma de amor.

Maison Albar AmoureVoltando ao pensamento de há uns parágrafos atrás, a crítica gastronómica já foi feita. Mas o que permanece não são os pratos, é a memória do cuidado. Da intenção. Da escuta. A escuta da terra, das estações, dos ingredientes, das pessoas. A mesma que encontramos na paisagem do Minho, que, como a pintura de um mestre, se repete e transforma. Também aqui, na cozinha do Maison Albar Amoure, há mudança suficiente para ser nova, mas não tanta que se perca. 

Maison Albar Amoure

O Chef Julien Montbabut, detentor de estrela no Maison Albar Monumental Palace, trouxe consigo essa sabedoria. E fá-lo em cumplicidade com o Chef Executivo Adjunto Marco Silva, cuja sensibilidade e rigor ajudam a dar corpo a esta nova morada gastronómica. A de quem sabe que inovação não é ruptura, mas continuidade atenta. Neste restaurante recém-nascido, o gesto é firme: a tradição está lá, nos sabores, nas texturas, na alma dos pratos, mas há também estética, leveza, uma elegância que não grita. 

Maison Albar AmoureComo o campo, que aceita a transitoriedade com naturalidade, também esta mesa sabe que a excelência não está no excesso, mas no ritmo certo. Por isso a experiência ressoa: porque é feita de sabor, mas também de permanência. E talvez por isso. só talvez, a eternidade, por breves instantes, tenha ali voltado a ser verde. 

Maison Albar Amoure

O que permanece é a possibilidade de eternidade que se abriu entre uma folha de batata e um fio de trufa. Entre um céu desenhado e uma promessa escrita num verso. Porque sim, no Minho, a terra canta. E o verde, o verde é mesmo uma promessa de eternidade.

Maison Albar AmoureEscrevo-vos estas linhas com o coração pousado no Minho, mas os pés agora cravados nas areias vulcânicas das Galápagos, onde estou em trabalho. Aqui o mar tem outra voz e os pássaros outro nome. Daqui, entre vulcões adormecidos, leões marinhos brincalhões, tartarugas pensativas e iguanas curiosas, envio um abraço e um beijo para quem teve a paciência de ler todo este texto. Que o vosso verde, onde quer que estejam, também cante. E que a promessa da eternidade, mesmo que breve, vos surpreenda num prato, num céu ou num sorriso.

Japão | O fio que costura um legado

“As coisas que mais nos impressionam não são as que gritam. São as que murmuram, lentamente, como se estivessem sempre à espera que as escutássemos.” Sei Shōnagon, O Livro do Travesseiro

Japão@Rainbow Bridge e Baía de Tóquio

Há uma lenda japonesa que fala de um fio invisível, atado ao dedo mindinho, que une irremediavelmente duas pessoas destinadas a encontrar-se. Esse fio pode esticar-se, enrolar-se, atravessar distâncias e anos, mas nunca se parte. 

JapãoNo Japão, essa imagem não é apenas romântica, é umbilicalmente civilizacional. Porque esse fio une não só amantes ou almas gémeas, mas também indivíduos ao coletivo, ao tempo e à forma como se habita o mundo. 

JapãoTudo no Japão parece responder a esse mesmo princípio: de que estamos ligados, e por isso somos responsáveis uns pelos outros. Caminha-se no metro como se num compasso coreografado, sem empurrões, sem ruído. 

JapãoGuarda-se o lixo até encontrar um sítio apropriado. Cumpre-se o dever sem ostentação. Sorri-se sem invadir. É um civismo que não nasce da vigilância, mas da interiorização de que o bem-estar comum é uma extensão do bem-estar individual, e vice-versa.

@Shiba Park Hotel, Tóquio

Talvez por isso, os grandes textos clássicos japoneses não sejam tratados de moral, mas de observação delicada. O Livro do Travesseiro, escrito por Sei Shōnagon no século X, é disso exemplo.

@Shiba Park Hotel, Tóquio

Numa coleção de notas, listas e pequenas descrições do quotidiano na corte imperial, revela-se uma cultura onde o gesto contido tem peso, onde a estética é um dever ético, onde a forma é conteúdo. Aquilo que para outros seria banal, como a brisa num biombo, o som de um carrilhão, ou o cheiro da madeira húmida, é, para Shōnagon, matéria de escrita, atenção, reverência.

@Zojo-ji e Tokyo Tower, Tóquio

E isso diz-nos tudo sobre a civilização japonesa: onde não há separação entre o íntimo e o público, entre o corpo e a paisagem. A música de Tōru Takemitsu, particularmente a peça Silence, continua essa tradição, a de valorizar o espaço entre os sons, o intervalo, o não-dito. Takemitsu não preenche o tempo, escuta-o. A sua música é como o Japão: há nela beleza, mas também comedimento; liberdade, mas sempre em relação com o outro.

@Zojo-ji e Tokyo Tower, Tóquio

Foi com esse estado de espírito, o de quem vai em busca de uma estética relacional, que embarcámos, no calor de Julho, rumo a Tóquio. E talvez tenha sido esse mesmo fio vermelho que nos levou, entre arranha-céus silenciosos e templos que respiram séculos, por um dos itinerários mais pitorescos que se pode percorrer.

@Toromasa, Tóquio: um izakaya (bar japonês com petiscos e refeições) especializado em peixe fresco, sashimi, tempura, maguro (atum) e pratos típicos japoneses acompanhados por lemon sour (uma bebida popular no Japão à base de shochu e limão).

O fio do percurso — guia da viagem, dia a dia

Para quem desejar seguir os nossos passos, ou simplesmente informar-se, deixo aqui um registo prático e cronológico da viagem. Um fio orientador que atravessa lugares, experiências, sabores e encontros, costurando cada dia com o mesmo cuidado com que o Japão nos acolheu: silenciosamente, com beleza e sentido.

@ Praça da Fonte Wadakura e Palácio Imperial de Tóquio, Tóquio

1º dia
A partida faz-se sempre com um certo silêncio interior. Deixámos o Porto rumo a Istambul, entre malas e expectativas. Um voo de transição, com tempo para pensar no Japão, essa ideia quase mitológica que íamos finalmente experimentar. 

@ Palácio Imperial de Tóquio, Tóquio

Istambul, efémera nesta etapa, serviu de ponte aérea e simbólica: o primeiro ponto de contacto com o Oriente. Iriamos voltar a ela duas semanas depois...

@Restaurante The Dinning, Shiba Park Hotel, Tóquio: Este espaço oferece uma fusão requintada de gastronomia japonesa, ocidental e chinesa, proporcionando uma experiência culinária muito rica e bastante heterogénea. 

2º dia
Chegámos a Tóquio ao fim da tarde, já envoltos pelo calor húmido do verão japonês. O Shiba Park Hotel, discreto e confortável, acolheu-nos sob a vigilância elegante da Tokyo Tower. 

@Tokyo Disney Resort, Tóquio

A vista era quase cinematográfica: edifícios modernos, silêncio urbano, e um verde inesperado nas redondezas. Perto dali, o Templo Zojoji, um dos grandes templos budistas da cidade, oferecia um contraste sublime entre espiritualidade ancestral e a modernidade circundante.

@Yanaka Ginza e Kakigōri, Tóquio: A rua é conhecida pelo seu charme nostálgico, lojas familiares, petiscos de rua e um ambiente que remete ao Japão do pós-guerra, longe do ritmo frenético da cidade moderna. A gelataria é internacionalmente conhecida pelo seu kakigōri artesanal, feito com gelo natural e xaropes caseiros , como o de morango que a Bia adorou!

3º dia
No terceiro dia, a pedido dos pequenos, explorámos um Japão diferente, onde a fantasia e o rigor se cruzam: o Tokyo Disney Resort. Mas mesmo aqui, tudo é intensamente japonês: a cortesia, a organização, a atenção ao detalhe.

@Santuário Fushimi Inari Taisha, Tóquio

O parque, meticulosamente limpo e silencioso para os padrões ocidentais, é um espelho do civismo nipónico. À noite, regressámos ao hotel para um jantar que nos passeou pelas iguarias das diferentes partes do Japão, mas cuidado: mesmo a refeição mais modesta é pensada com uma estética quase cerimonial.

@Parque de Ueno,  Lago Shinobazu e Templo Bentendo dedicado à deusa Benzaiten, Tóquio

4º dia
Dedicámos o dia a percorrer Tóquio com outros olhos. O Templo de Sensoji, em Asakusa, é o mais antigo da cidade e talvez o mais visitado. Percorrer a Nakamise-dori, a rua de acesso repleta de lojas de doces, talismãs e quimonos, é como mergulhar num Japão onde o turismo convive com a devoção. 

@Ameya-Yokocho frequentemente chamada apenas Ameyoko, situada entre as estações de Ueno e Okachimachi, Tóquio: um mercado ao ar livre famoso pelas roupas, cosméticos, snacks, frutos secos, peixe fresco e uma enorme variedade de comida de rua . Este é um verdadeiro clássico para quem visita Tóquio.

Visitámos ainda o bairro de Akihabara, paraíso da eletrónica e da cultura otaku, onde o futuro tecnológico japonês se mostra sem reservas.

@Shinkansen na estação de Tóquio

5º dia
Tivemos um dos momentos mais especiais da viagem: subimos ao Monte Takao, um santuário de natureza e espiritualidade a apenas uma hora do centro de Tóquio.

@Shinkansen e vista do Monte Fuji a partir do Shinkansen

Lá em cima, entre árvores centenárias e o sussurro dos sinos do templo, respira-se outro Japão, aquele em que o silêncio é eloquente e onde se aprende a escutar a montanha como quem escuta um poema. Ao final do dia, regressámos ao hotel com o corpo cansado e o espírito leve.

@Hilton Garden Inn Kyoto Shijo Karasuma, Quioto

6º dia
Deixámos Tóquio a bordo do Shinkansen, o comboio de alta velocidade (320 km/h) que se move com a precisão de um relógio suíço e a suavidade de um suspiro. Aproximadamente 40 minutos após a partida de Tóquio, entre as estações de Shin-Yokohama e Shizuoka, o monte surge à direita do comboio (assentos do lado “E”), imponente e sereno, como uma aparição silenciosa. Em dias limpos, como naquele em que viajámos, a visão é inesquecível, em forma de lembrete natural da harmonia entre força e delicadeza que define o Japão.

@Templo Higashi Hongan-ji, Quioto

Chegados a Quioto, instalámo-nos no Hilton Garden Inn e fomos calorosamente recebidos por Shigeko Nakagawa.   À noite, partilhámos com ela um jantar que foi mais do que gastronómico: foi humano. No Japão, comer juntos é um acto de afinidade silenciosa.

@Restaurante Together , Hilton Garden Inn Kyoto Shijo Karasuma, Quioto: oferece uma experiência gastronómica que combina pratos ocidentais com ingredientes locais de Quioto, num ambiente moderno e acolhedor.

7º dia
Quioto revelou-se como uma respiração pausada. Visitámos o Arashiyama Monkey Park, subindo a colina sob um calor húmido, com macacos a observarem-nos de cima. A vista da cidade, lá do alto, é quase irreal. No Kinkaku-ji, o pavilhão coberto a folha de ouro ergue-se sobre um lago calmo como um espelho, refletindo uma beleza quase irreal — não apenas estética, mas espiritual. Atravessámos a ponte Togetsukyo e deixámo-nos levar por esse Japão natural, onde a água, o bambu e a brisa contam histórias sem palavras.  Já em Arashiyama, a poucos passos da ponte, entrámos num corredor verde de bambus altos e silenciosos, onde até o vento parece mover-se com respeito. Ali, o tempo abranda. Cada passo é como atravessar um poema suspenso entre sombra e luz.

Japão

À noite, o jantar no Jean-Georges, no The Shinmonzen, trouxe-nos um Japão reinterpretado pela alta cozinha de um Chef com 3 estrelas Michelin, mas sem perder a alma. Tudo como se o fio vermelho da tradição continuasse ali, mesmo nos pratos reinventados. Cada prato é uma composição estética, quase caligráfica.

@Ponte Togetsukyo, Iwatayama Monkey Park, Santuário da montanha de Iwatayama e rio Hozu, Quioto

8º dia
Entrámos num Japão lúdico e profundamente criativo: a visita à Nintendo World foi um regresso à infância, mas também uma aula de engenharia narrativa. A cultura pop japonesa não é mero entretenimento: é uma disciplina de detalhe, de imersão, de controlo absoluto da experiência. 

@Templo Tenryū-ji, Arashiyama: Jardim Sogenchi, Bosque de bambus e Arashiyama Bamboo Grove. É um dos mais belos jardins paisagísticos japoneses, com lago central, pedras decorativas, pinheiros e colinas ao fundo. Foi desenhado por Musō Soseki no século XIV e permanece praticamente inalterado.

Foi um dia de sorrisos, pixels e memórias.

@Jean-Georges at The Shinmonzen:  Jean-Georges Vongerichten, chef francês com 3 estrelas Michelin brinda-nos com uma cozinha francesa moderna com influências japonesas e ingredientes locais sazonais. O ambiente é sofisticado e intimista, num edifício restaurado em estilo machiya com design de Tadao Ando. Está localizado junto ao rio Shirakawa, em Gion, uma das zonas mais charmosas de Quioto.

9º dia
Regressámos a Tóquio, desta vez para nos instalarmos no KOKO HOTEL Tsukiji Ginza, a dois passos do mercado de peixe e da elegância discreta das ruas de Ginza. 

@ Palácio Imperial de Quioto: Shishinden, Portão Seiryōmon e Kenchūdō 

Aproveitámos o passe de transporte livre para visitar dois ícones: o Templo de Sensoji, revisto agora com outra luz  e a Tokyo Skytree, que nos ofereceu a cidade aos nossos pés, numa visão quase suspensa, entre nuvens e geometrias.

Japão

@Loja Nintendo, Quioto

10º dia
Acompanhados por um coordenador local, a amável Yuko,  solícita, discreta e conhecedora, percorremos o Meiji Shrine, pulmão espiritual da cidade, construído em honra do imperador Meiji. Seguimos para o Edo-Tokyo Open Air Architectural Museum, onde casas tradicionais de madeira, lojas antigas e banhos públicos preservam a memória urbana do passado. 

@Nishiki Market, Quioto. Conhecida como a “cozinha de Quioto”. Esta estreita galeria comercial cobre cerca de 400 metros e alberga mais de 120 lojas e bancas especializadas em alimentos típicos da região. Por lá encontrámos produtos locais como tsukemono (vegetais em conserva), tofu fresco, chá, e especiarias como yuzu kosho; comida de rua como espetadas de polvo, patas de caranguejo real, mochi grelhado, omeletes doces (dashimaki tamago), croquetes de wagyu, entre outros; e utensílios e souvenirs: desde facas japonesas artesanais a pratos de cerâmica. Fica a poucos minutos a pé do Hilton Garden Inn Kyoto Shijo Karasuma.

Fomos almoçar ao restaurante Tonki, em Meguro. Este estabelecimento, fundado em 1939, é uma verdadeira instituição em Tóquio, conhecido pela sua especialidade: o tonkatsu. O ambiente é simples e acolhedor, com um balcão que permite observar a equipa a trabalhar com precisão e dedicação. Entre os pratos servidos, destacam-se o rosu katsu (lombo de porco) e o hire katsu (filé de porco), ambos acompanhados de arroz, pickles e uma sopa tonjiru rica em sabor. A experiência foi memorável, não apenas pela qualidade da comida, mas também pela atmosfera que evoca a Tóquio de outrora, proporcionando uma ligação autêntica à cultura culinária nipónica. Foi a melhor experiência gastronómica que tivemos nesta viagem, muito por culpa de Tonkatsu Hasegawa, de 90 anos e que cozinha há ... 70!!!  À tarde, explorámos o Kabuki-za, teatro dedicado à forma mais clássica de teatro japonês, e depois o Ginza SIX, onde o luxo é mais sussurro do que grito.

@ Pavilhão Dourado e Santuário Yasaka, Quioto. O pavilhão é um dos templos mais emblemáticos de Quioto e Património Mundial da UNESCO. A sua estrutura coberta a folha de ouro e o reflexo no espelho de água tornam-no um dos pontos mais fotogénicos do Japão. O santuário é um dos templos xintoístas mais importantes de Quioto e palco central do Gion Matsuri, o festival mais famoso da cidade.

11º primeiro dia
Último dia inteiro no Japão. Mais uma vez, com o apoio da Yuko, explorámos a cidade ao nosso ritmo. Entre lojas, pequenos restaurantes de ramen e ruas onde o futuro parece estar já instalado, despedimo-nos devagar. 

Japão

@Templo Higashi Hongan-ji  e Kyoto Tower, Quioto

O fio vermelho que nos trouxe até aqui começava agora a enrolar-se na memória.

@Senso-ji, Tóquio. É o templo budista mais antigo e emblemático de Tóquio, localizado no bairro de Asakusa. É facilmente reconhecido pelo enorme lanterna vermelha na porta de entrada Kaminarimon e pela sua pagode de cinco andares. É um dos locais mais visitados por turistas e devotos no Japão.

12º - 14º dias (Istambul)
Na viagem de regresso, como que por vontade do próprio destino, ficámos três dias em Istambul, graças ao programa stayover da Turkish Airlines. A cidade, com as suas mesquitas como montanhas sagradas e os seus mercados em permanente combustão, ofereceu-nos um contraste vibrante, como se quiséssemos, antes de regressar, lembrar que o mundo é grande, plural e profundamente belo.

@ Tokyo Skytree, Tóquio: esta é a estrutura mais alta do Japão e uma das maiores torres do mundo, com 634 metros de altura. Os seus decks de observação proporcionam vistas panorâmicas incríveis da cidade de Tóquio.

A cidade, ainda por explorar, parecia respirar por mil janelas. Foi uma transição suave, como se estivéssemos ainda entre dois mundos...

@Shibuya, Tóquio: na famosa Shibuya Crossing, uma das passadeiras mais movimentadas e icónicas do mundo. É um símbolo da energia e intensidade da vida urbana em Tóquio, com os seus néons, multidões e ritmo vibrante.

No Sheraton Istanbul Atakoy Hotel, descansámos entre incursões ao passado otomano e experiências gastronómicas intensas, como o jantar no Abdulkadir, onde os sabores nos puxaram para o coração do Médio Oriente.

@Museu ao ar livre Edo-Tokyo, Koganei: recria edifícios históricos japoneses de diferentes épocas, permitindo aos visitantes caminhar por ruas que reproduzem a atmosfera do Japão antigo e moderno, incluindo casas tradicionais, lojas e até um bonde antigo. É um local fascinante para aprender sobre a história urbana de Tóquio e ideal para passeios em família.

Em 48 horas, Istambul oferece uma travessia entre continentes e séculos. Começar na zona de Sultanahmet é inevitável: entrar na Hagia Sophia, onde os mosaicos bizantinos convivem com os versículos do Corão, é sentir o peso da história nos ombros. A poucos passos, a Mesquita Azul convida ao silêncio e à simetria, e o Palácio de Topkapi mostra os excessos e refinamentos de um império que moldou o mundo. 

@Tonki, Meguro, um pequeno restaurante tradicional japonês especializado em tonkatsu um prato de porco panado e frito, servido com repolho, arroz, sopa miso e molho espesso e preparado pelo o lendário Tonkatsu Hasegawa.

Ao fim da tarde, a Cisterna da Basílica revela-se como um segredo subterrâneo, com as suas colunas mergulhadas numa penumbra quase onírica.

@ Meiji Jingu, Tóquio: este é o santuário xintoísta mais importante de Tóquio, rodeado por uma impressionante floresta urbana em Harajuku. O grande torii de madeira, os barris de sake decorativos e os caminhos de cascalho são marcas inconfundíveis deste local.

No segundo dia, atravessar o Bósforo ou subir à Torre de Gálata é mudar de perspetiva: Istambul vista do alto ou da água torna-se ainda mais hipnótica. Atravessar a ponte até Karaköy ou explorar o bairro boémio de Cihangir revela um lado mais contemporâneo da cidade, com cafés de autor, livrarias escondidas e uma vibração criativa.

@ Takeshita Street, Tóquio: é uma das ruas pedonais mais icónicas da cidade, conhecida pela moda excêntrica, lojas de roupa acessível, snacks coloridos como crepes ou algodão-doce gigante, e um ambiente jovem e vibrante.

E, claro, perder-se no Grande Bazar ou no Mercado das Especiarias não é apenas uma atividade turística, mas um ritual sensorial: cores, vozes e aromas entrelaçam-se como um tapete persa que só se entende caminhando.

@Festival Bon Odori, Tóquio: caracterizado pelas lanternas tradicionais japonesas (chōchin), trajes yukata e danças circulares em torno de um palco elevado (yagura), de onde os músicos tocam taiko e guiam as danças. O edifício ao fundo é o Tsukiji Hongan-ji, um templo budista singular de inspiração indiana em Tóquio.

Seis dicas práticas para quem vai seguir o nosso conselho e visitar o Japão:

1. Respeita o silêncio pois ele é parte da linguagem
No Japão, o silêncio não é vazio: é conteúdo. Nos transportes públicos, nos hotéis e até em espaços turísticos movimentados, fala-se baixo, evita-se o telefone e privilegia-se a contenção. É um traço cultural profundamente enraizado e que nos obriga a abrandar e observar. Levar auscultadores, um livro ou simplesmente aprender a escutar o ambiente são formas de respeitar e viver melhor esse silêncio.

@Praia de Odaiba (Odaiba Plage), Decks Tokyo Beach Center e Tokyo Trick Art Museum , Tóquio: uma área recreativa artificial com vista para a baía, ideal para relaxar em família. Ao fundo vê-se a Rainbow Bridge e o skyline da capital nipónica. No centro  descobrimos uma pequena maravilha: os takoyaki da Kukuru, um dos nomes mais reputados nesta especialidade de Osaka. As bolas de massa quente, recheadas com pedaços generosos de polvo e cobertas com molho espesso, maionese japonesa e katsuobushi a dançar ao vapor, foram uma das surpresas mais memoráveis da viagem. O museu é muitas vezes referido como o “Museu das Ilusões” local. Este espaço interativo e lúdico é dedicado à arte de ilusão tridimensional, onde pinturas e cenários criam efeitos visuais que desafiam a perceção. Inspirado na estética da era Edo, o museu oferece ambientes temáticos como zonas de ninjas, fantasmas e recriações de obras clássicas com um toque de humor. 

2. Compra o Japan Rail Pass antes de chegar
O Japan Rail Pass permite viajar entre cidades (como de Tóquio para Quioto) com os icónicos Shinkansen, a preços muito inferiores aos bilhetes comprados no Japão. Mas atenção: só pode ser adquirido fora do país. É um investimento que compensa logo na primeira grande deslocação e oferece flexibilidade, rapidez e um conforto irrepreensível.

@ Miraikan – Museu Nacional da Ciência e Inovação Emergente, Odaiba, Tóquio. A esfera suspensa é o Geo-Cosmos, um impressionante globo digital composto por milhares de painéis LED OLED, que exibe imagens em tempo real da Terra a partir de satélites. O Miraikan é uma celebração da ciência contemporânea, com exposições interativas sobre robótica, espaço, ambiente, neurociência e inteligência artificial , ideal para curiosos de todas as idades.

3. A beleza está nos detalhes (e nos bairros menos óbvios)
É tentador focar-se apenas nos grandes marcos turísticos (e são, de facto, imperdíveis), mas o verdadeiro Japão revela-se muitas vezes nos bairros residenciais, nos pequenos jardins, nos templos fora do roteiro. Em Tóquio, vale a pena perder-se por Yanaka ou Kichijoji; em Quioto, visitar templos menos visitados como o Honen-in ou caminhar pelas margens do rio Kamogawa ao entardecer.

@Istanbul Sheraton Istanbul Atakoy Hotel, Istambul

4. Leva dinheiro vivo e um bom par de meias
Apesar de ser um país tecnologicamente avançado, muitos estabelecimentos em Quioto e Tóquio, especialmente os restaurantes de rua, templos e mercados, ainda funcionam apenas com dinheiro vivo (yen). Além disso, como é costume tirar os sapatos em muitos locais (desde alojamentos a restaurantes e museus), ter meias impecáveis é uma dica prática e culturalmente sensível.

@Grande Bazar e restaurante Sofra: o restaurante é conhecido pela comida tradicional turca servida num ambiente acolhedor e familiar, com pratos como o Testi Kebab, um guisado cozinhado dentro de uma jarra de barro que é aberta com fogo à mesa.

5. Experimenta a gastronomia sem medo, mesmo nas pequenas tasquinhas
No Japão, comer bem não depende do tamanho do restaurante. Às vezes, a melhor tigela de ramen ou o sushi mais fresco vem de um balcão discreto, escondido numa rua estreita. Mesmo sem compreender o menu, a cortesia japonesa ajuda sempre — e as máquinas de pedidos com imagens facilitam muito. Experimentar é parte essencial da viagem, e a probabilidade de te surpreenderes é altíssima.

@Hagia Sophia (Ayasofya) e à Mesquita Azul (Sultanahmet Camii), Istambul: os interiores ricamente decorados, os detalhes em mosaico bizantino e islâmico, a imponência das cúpulas e o ambiente solene são arrevatadores. 

6. Faz um seguro de saúde, mesmo que nunca precises (e faço votos para que não precises ;))
Viajar pelo Japão é, na maioria dos casos, seguro e tranquilo. Mas o sistema de saúde japonês, embora excelente, é caro para visitantes sem cobertura. Um seguro de viagem com assistência médica garante não só proteção em caso de imprevistos, mas também tranquilidade mental. Mesmo uma simples ida ao hospital pode implicar custos elevados (isso acabou por acontecer por causa de uma febre da Bia que passou rapidamente). Num país onde tudo funciona com rigor, estar prevenido é uma forma de respeito por ti e pelo lugar que te recebe.

@Hagia Sophia (Ayasofya) e Abdulkadir Restaurant: o restaurante é um verdadeiro tesouro da culinária tradicional turca situado no coração de Istambul. Com um ambiente acolhedor e familiar, este restaurante destaca-se pelo conceito de esnaf lokantası, onde a comida do dia é preparada com simplicidade e mestria, evocando os sabores autênticos das cozinhas caseiras da Anatólia. Entre os destaques refiro o kuru fasulye (feijão branco estufado), o etli soğan dolması (cebolas recheadas com carne) e o irresistível iskender kebap. Uma paragem no Abdulkadir é mais do que uma refeição, é uma imersão na generosidade e na tradição gastronómica turca.

No final, resta a memória, feita de imagens, sons e sabores, e a certeza de que o tal fio invisível não se rompeu. Ligou-nos a este país fascinante, ao seu silêncio civilizado, à sua estética do respeito. E também nos ligou uns aos outros, na partilha da experiência, na descoberta conjunta, no espanto partilhado.

Japão

Foi uma viagem entre mundos, entre tempos, entre versões de nós próprios. E talvez seja esse o verdadeiro destino: sermos conduzidos, por esse fio vermelho, a lugares que nos transformam. Um muito obrigado a todos aqueles que contribuiram para ela. 

それは、世界と世界、時と時、自分自身のさまざまな姿の間を旅するものでした。 そして、おそらくそれこそが本当の目的地なのでしょう。赤い糸に導かれ、私たちを変えてくれる場所へとたどり着くこと。 この旅に関わってくれたすべての人に、心から感謝します。

Bu, dünyalar arasında, zamanlar arasında ve kendimizin farklı yüzleri arasında yapılan bir yolculuktu. Ve belki de gerçek varış noktası tam da budur: kırmızı bir iplikle yönlendirilerek bizi dönüştürecek yerlere ulaşmak. Bu yolculukta yer alan herkese yürekten teşekkür ederim.