Restaurante Rabelo - Vintage House Hotel | Alma e coração eternos pela harmonia
"Nada é para sempre, dizemos, mas há momentos que parecem ficar suspensos, pairando sobre o fluir inexorável do tempo." José Saramago
Uma das coisas mais apaixonantes da vida é a alegria que sentimos ao descobrir um lugar onde sabemos que vamos ser felizes. A saudade de um sítio que nunca estivemos e que desperta em nós um sentimento de pertença.
No coração do alto Douro vinhateiro, no Pinhão, o Vintage House Hotel é um desses lugares. O programa inicial era de apenas visitar o Restaurante Rabelo, acabamos por conhecer o Hotel também.
No Rabelo fomos recebidos pelo amabilíssimo João Pinho que nos deu as boas vindas em forma de Bolinho de queijo dos Açores e bolacha acompanhado pela secura, fruta e carvalho do Taylors Chip Dry Port. O bolinho parecia assente numa espécie de queijo reduzido, muito concentrado. É salgado, intenso, cremoso e fresco.
Seguiu-se a ceviche de salmão e salmão braseado. Duas texturas de salmão que se complementam e conquistam complexidade cruzada. Harmonioso e muito intenso, prepara o palato e prolonga os sentidos. Adorei a ideia das caixas de Petri que protegiam flores e apresentavam sabores. Iniciou-se então uma afável conversa...
Acho que esta iria ser a refeição em que mais falei de vinhos. Muito por culpa do João :-P Para o salmão escolheu o Piano Reserva 2016. Com maçã, pêra, pitaia, maracujá e barrica, este Piano assenta em composições complexas de notas minerais e tosta. A fruta e mineralidade enobreceram a gordura e riqueza aromática do salmão. É isto, "simplesmente isto", que se pretende numa harmonização. Este vinho é tão longo, elegante e intrigante que brilharia também a solo.
O almoço decorreu na esplanada do restaurante, sobre o Pinhão, num ambiente clássico e requintado. Com uma vista deslumbrante sobre o rio Douro, as iguarias são servidas numa "cabana gastronómica" protegida por árvores, ramadas de vinha e vegetação. Enquanto ouvia o Piano...
Surge na mesa a Vieira, creme de abobora, redução de espumante, presunto e caviar. O creme de abóbora continha canela mas o caviar não o tornava enjoativo. Há uma fusão muito engraçada entre os sabores da terra, do mar ... e da vinha :P
O gosto a peixe é embalado pelo creme de abobora e redução de espumante, enquanto que o presunto e o caviar provocam explosões degustativas que perturbam esta aparente "serenidade". É um prato de contrastes e é simplesmente ... óptimo!!!
A escolha do tinto que iria acompanhar os pratos principais foi bastante peculiar.
A primeira opção foi o Pomares Tinto Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo 2014, como já conhecíamos este vinho, o João foi à garrafeira buscar outro. A opção seguinte foi o Quinta do Passadouro 2012. Não servia porque também já o tínhamos provado. A derradeira opção foi o Quinta Vale do Bragão Reserva 2013, ufa... :-P
Iria acompanhar dois pratos, mostrando a versatilidade do vinho e a mestria da harmonização. O primeiro, bacalhau confitado a baixa temperatura, puré de grão de bico, microcebola e molho de carne. Bacalhau TOP, molho TOP. Fazem sentido em conjunto.
O sabor a mar inspirador do bacalhau entra-nos pelo palato a dentro e fixa-se nos rochedos da nossa alma. Cozinhado no ponto e com os acompanhamentos bem pensados provoca uma erupção de texturas, influências e sabores.
O molho de carne fez a ponte perfeita para os morangos, cerejas, amoras, ameixa e tosta deliciosa do Quinta Vale do Bragão Reserva 2013. As vinhas velhas originaram fruta muito madura, quase em compota, taninos robustos e uma acidez irreverente. Acaba longo, com muita garra, intensidade e persistência.
Depois, o meu prato favorito deste almoço à beira Douro apreciado: Magret de pato, crocante na gordura exterior e saboroso na carne interior. Muito rico, suculento e saboroso. Os taninos do vinho formam um íman para a deliciosa gordura do magret que foi equilibrada pela distinta acidez. Um prato que apenas fica completo com o vinho, um vinho que necessita de um prato como este pato para se realizar completamente.
Este foi um almoço em que a Bia desfrutou do Rabelo quase tanto como os papás. Enquanto apreciávamos estes pratos deliciosos e vinhos inspiradores a pequena princesa ia alegrando as mesas vizinhas com as suas gargalhadas e cantorias. Os totozinhos fizeram sucesso :-P É bom ver que já nutre a mesma paixão pelo Douro...
O vinho que acompanhou a sobremesa é presença assídua na mesa de Natal do João e nas trocas de prendas com o seu irmão. Um Late Bottled Vintage Fonseca Unfiltered 2011. Aos habituais aromas a chocolate, cereja, groselha, amora e especiarias, este 2011 acrescenta cassis, eucalipto e menta. O grande ano de 2011 tornou-o mais denso, delicioso e rico. O que lhe falta em frescura ganha em voluptuosidade e volume.
Foi o par ideal para a Sericaia (ovos e canela), amora, mirtilos, framboesa e gelado de baunilha. As frutas do vinho e sobremesa fundiram-se de maneira muito sedutora. A sua confecção, a sua origem, o seu sabor rico e complexo, o toque de canela e a textura macia desta sobremesa dotam-na de alma e coração em forma de doce.
Com este menu desenhado pelo duas estrelas Michelin Ricardo Costa, o chefe João Santos dignificou as tradições gastronómicas da região, dando a conhecer os produtos locais e as receitas típicas do Douro, oferecendo aqueles que são apelidados de “os melhores sabores do Douro”.
Com o almoço ainda entre a alma e o coração, tivemos a oportunidade de conhecer o Hotel. Beatriz Garcia, a gerente do Vintage House, informou-nos que ali os dias começam com um pequeno-almoço buffet no salão do rio, onde pode deixar-se encantar pela vista do rio Douro.
Além de usufruir de um refúgio confortável e sofisticado num cenário de “cortar” a respiração, os hóspedes têm várias actividades à sua espera, como caminhadas pelas colinas do Douro, provas de vinho na Quinta da Roêda ou um mergulho na piscina. Mergulho esse bem agradável uma vez que neste dia a temperatura chegou a atingir os 40ºC!!!
A vários quilómetros da azáfama das grandes cidades, o Vintage House Hotel é ainda o local ideal para quem precisar de descomprimir do stress diário. Ao final do dia, os visitantes poderão “viajar” pelas páginas de um livro no ambiente acolhedor do Bar Library, enquanto desfrutam da companhia de um bom vinho do Porto.
Foi edificado sobre uma charmosa casa do século XIX, preservando alguns dos traços, tanto no exterior como no interior, e a decoração foi especialmente pensada para criar uma atmosfera acolhedora e confortável de refúgio campestre. Mas mais do que os serviços do hotel, o Vintage House pretende ser um ponto de partida para descobrir o Douro.
O Douro, esse universo virginal de Miguel Torga, como se tivesse acabado de nascer, e já eterno pela harmonia, pela serenidade, pelo silêncio que nem o rio se atreve a quebrar, ora a sumir-se furtivo por detrás dos montes, ora pasmado lá no fundo a reflectir o seu próprio assombro. Um poema geológico. A beleza absoluta. O que o poeta disse do rio, aplico-o também ao Hotel e ao seu restaurante ...
Há momentos que parecem ficar suspensos. Há outros, como este que hoje vos falei, que se imortalizam na nossa memória. Eterno pela harmonia, pela alma e pelo coração das pessoas que lá encontrei.
É um restaurante fascinante num hotel encantador. Foi dos melhores serviços que encontrei por esse país fora, parabéns a todos, em especial ao João Pinho pela conversa, quase tanto agradável e inebriante, como os vinhos que nos serviste :-P
Até à próxima!!!
Obrigado Filipa pelo convite ;-)